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Jonas (13/09)
Muito bom ler acerca desses fatos históricos, onde há muitas versões, ...
santiago (09/09)
Parabens pela viagem! linda fantastica, amei esse bloc. Felecidade a voce...
mabel (09/09)
Muito gostoso ter novamente os relatos. Lugares muito diferentes!!!! A...
Ana Christ (09/09)
Rodrigo e Ana, venho por meio dessa (rsrs), dar notícias sobre minha via...
Ana Friedl (07/09)
Gostaria de saber se vocês atravessam panamá , Costa Rica . E se sim di...
Prédio histórico de St. Pierre, antiga capital de Martinica
Impossível não pensar no Mount Pelée e na tragédia de 1902 aqui em St. Pierre. Mas nem só disso vive a cidade! Lá se vão 110 anos daquele fatídico 08 de Maio, a cidade foi reconstruída e seus habitantes levam uma vida muito normal!
Com o nosso carro nas estradas de St. Pierre, antiga capital de Martinica
Caminhando em rua de St. Pierre, antiga capital de Martinica
A população de hoje é apenas 1/6 do que era ao final do século XIX, quando St. Pierre era a orgulhosa capital da Martinica, com 30 mil habitantes. Hoje, é uma tranquila cidade do interior, com belas praias de águas transparentes e calmas, excelentes para um banho ou para fazer snorkel.
Mercado de St. Pierre, antiga capital de Martinica
Nas ruas do centro, um movimentado mercado, alguns restaurantes e bares de frente à orla e ao porto. Bastam uns 15 minutos de caminhada para percorrer as duas ruas principais, onde estão a igreja, o antigo teatro, o museu e alguns prédios históricos.
Cardápio de restaurante em St. Pierre, antiga capital de Martinica
Nosso lanche predileto na Martinica: saunduíche na baguete!
Depois do mergulho pela manhã, nós estivemos um pouco por ali. O almoço foi o tradicional e delicioso sanduíche na baguete. Afinal, estamos na França! Depois, uma cerveja gelada no boteco copo sujo na orla.
Nosso hotel em St. Pierre, no norte de Martinica
De volta o nosso hotel, no sul da cidade, uma deliciosa tarde na praia de areias escuras. Tínhamos de repartir toda aquela praia com no máximo outras 4-5 pessoas. Cenário ideal para relaxar e não pensar em nada.
Tranquila praia de areias escuras ao sul de St. Pierre, no norte de Martinica
Banho de mar no fim de tarde em praia no sul de St. Pierre, no norte de Martinica
Melhor ainda foi ir nadar no mar, levando nossas máscaras e câmera fotográfica. Enquanto o sol se punha, a gente perseguia linguados e caranguejos ou simplesmente se deliciava naquela água quase morna com visibilidade de mais de 15 metros. Uma enorme piscina.
Fazendo snorkel nas águas azul-transparentes de St. Pierre, no norte de Martinica
Fazendo snorkel nas águas azul-transparentes de St. Pierre, no norte de Martinica
Foi nossa última tarde em St. Pierre e na Martinica. Não poderia ter sido mais gostoso! Amanhã, nosso barco para Sta. Lúcia só sai de tarde, então ainda vamos poder pegar uma prainha pela manhã! Depois, algum tempo para ver a capital Fort-de-France e para o sul seguimos, a última perna de barco nessa etapa da viagem. De volta à fala inglesa e ao lado esquerdo da estrada...
Fazendo snorkel no fim de tarde em praia ao sul de St. Pierre, no norte de Martinica
Parada para fotos em um rio maravilhoso no caminho entre Bariloche e San Martín de Los Andes, na Argentina
Nesse nosso primeiro dia de explorações por essa belíssima região da Argentina, resolvemos percorrer de carro uma das estradas que liga Bariloche à San Martín de Los Andes, no norte. Digo “uma das estradas” por que são várias as rotas que ligam essas duas cidades, algumas mais rápidas, outras nem tanto, algumas mais curtas, outras nem tanto. A mais famosa e cênica delas é a chamada “Ruta de los Siete Lagos”, exatamente por que passamos por vários lagos ao lado da estrada. Esse será nosso caminho de volta, ao longo dos próximos dias. Hoje resolvemos seguir por uma das estradas mais a leste. Por aí segue a principal rota entre as duas cidades, já toda asfaltada, embora seja mais longa. Nós pegamos apenas o início dessa estrada e, um pouco à frente, tomamos um desvio de rípio que corta o belíssimo Parque Nacional Lanin, em meio a lagos e rios. É um caminho mais curto, porém muito mais demorado e empoeirado. Mas já que estamos de Fiona, não temos nada a temer!
Paisagem do Parque Lanin, na região de San Martín de Los Andes, na Argentina
Ainda antes de sairmos de Bariloche, nos armamos de um lanche até de uma garrafa de vinho. A ideia era passar o dia na estrada, parar em lagos e rios e encontrar um bom lugar para fazer um piquenique. Chegaríamos à San Martín apenas no final do dia, que como vocês já sabem, é bem tarde por aqui nessa época do ano. Depois das compras e da conversa no Club Andino para obtermos mapas e informações, já era quase meio dia quando partimos. Não faz mal, ainda tínhamos umas oito boas horas de luz pela frente!
Estrada que atravessa o parque Lanin, na região de San Martín de Los Andes, na Argentina
Estrada que atravessa o Parque Lanin, na região de San Martín de Los Andes, na Argentina
O primeiro trecho da viagem foi rápido, sempre no asfalto e contornando o lago Nahuel Huapi, onde está Bariloche. Apenas uma parada aqui ou ali para admirar e tirar fotos do lago e da cidade que ficava para trás. Depois, a bifurcação de estrada aonde chega o tal caminho dos 7 Lagos, por onde voltaremos em dois dias. Por fim, o asfalto continua até o ponto onde pegamos o “atalho” de rípio. Boa parte do movimento de carros segue pelo asfalto, pouca gente animada em enfrentar a estrada empoeirada. “Rípio” é uma espécie de estrada de terra encascalhada que é muito comum aqui na região andina, tanto no lado argentino como chileno. Certamente, ao longo dos próximos meses, vamos ter de enfrentar muitas centenas de quilômetros nesse tipo de piso, então é bom já irmos acostumando! Tanto nós como a Fiona!
Uma belíssima curva de rio na região de Bariloche, na Argentina
Rio de águas azuis, transparentes e geladas na região de Bariloche, na Argentina
Já no rípio, a estrada bifurca novamente. Em frente para a pequena Villa Trafull, nosso destino em dois dias. Para o norte, o caminho que pegamos hoje, rumo à San Martín. Agora já estamos em pleno Parque Nacional Lanin e a beleza do cenário que nos cerca não deixa nenhuma dúvida sobre o porquê dessa região ser protegida. Cruzamos montanhas e descemos vales. Do alto das primeiras temos uma visão panorâmica de toda a região, no fundo dos últimos cruzamos com rios e lagos cuja água são de um azul inacreditável, transparentes e puros. E gelados! Essa água é constantemente abastecida pelo degelo da neve das grandes montanhas andinas justo ali do lado, seja inverno, seja verão.
Rios azuis e montanhas ao fundo, paisagem patagônica na região de Bariloche, na Argentina
Parada para fotos em um rio maravilhoso no caminho entre Bariloche e San Martín de Los Andes, na Argentina
Os rios são realmente verdadeiros cartões postais. Essa é uma das melhores regiões do mundo para se praticar a “fly fish”, ou pescaria de mosca. É aquele tipo de pesca em que o pescador usa grandes botas e roupa a prova d’água, entra no rio e atira sua isca apenas na superfície da água. A isca tem o formato de mosca, o prato predileto dos peixes. Vimos muito isso no Alaska, onde os pescadores dividiam o rio com ursos. Aqui na Patagônia andina essa modalidade de pesca também é bem popular e muitos americanos e canadenses viajam para cá apenas para fazer isso. Eu não sou muito de pesca, mas só de ficar num cenário maravilhoso desse o dia inteiro já está valendo a pena!
Um rio que mais parece um cartão postal, no Parque Lanin, região de San Martín de Los Andes, na Argentina
Um rio que mais parece um cartão postal, no Parque Lanin, região de San Martín de Los Andes, na Argentina
Nós encontramos uma curva de rio perfeita para esse tipo de pesca, onde as águas ficam um pouco mais paradas. Perfeita para a pesca e perfeita para fotos e admiração. Agora na primavera fica tudo ainda mais bonito, pois os campos e cabeceiras de estradas se cobrem de flores brancas e amarelas. Misture essas cores com o verde dos bosques e o azul do céu e dos rios e terá a receita para a foto perfeita!
Época de primavera, muitas flores na região de Bariloche, na Argentina
Lago Lacar, chegando a San Martín de Los Andes, na Argentina
Bom, depois dos rios, vieram os lagos. Alguns mais esverdeados, outros mais azulados, são como grandes espelhos refletindo as montanhas ao seu redor. Passamos por alguns menores e outros maiores e até resolvemos pegar um desvio para seguir até um dos mais belos da região, o Filo Hua Hum. Ao chegar pelo alto e admirar suas margens, praias e entorno, logo decidimos: aí seria nosso piquenique. Por estar fora da rota principal, o lago é um dos menos visitados e ali teríamos toda a tranquilidade desejada. Seus únicos frequentadores são os pescadores de mosca que, reconheço, sabem bem escolher um lugar!
Lago espelhado na região de Bariloche, na Argentina
Chegando ao lago Fila Hua Hum, no parque Lanin, região de San Martín de Los Andes, na Argentina
Praia do lago Fila Hua Hum, no parque Lanin, região de San Martín de Los Andes, na Argentina
Descemos com o carro até perto do lago, deixamos ele num camping e caminhamos um pouco para encontrar uma praia. Aí estendemos nossas cangas e, inspirados pelo cenário, tratamos de abrir nossa garrafa de vinho e os queijos que havíamos trazido. Depois, foi só relaxar e curtir...
Caminhando em praia do lago Fila Hua Hum, no parque Lanin, região de San Martín de Los Andes, na Argentina
Abrindo um vinho em praia do lago Filo Hua Hum, no parque Lanin, região de San Martín de Los Andes, na Argentina
A Rowan toma um vinho em praia do lago Filo Hua Hum, no parque Lanin, região de San Martín de Los Andes, na Argentina
Talvez animada pelo vinho e já acostumada pelas temperaturas das highlands escocesas, a Rowan não titubeou. Colocou seu maiô e foi enfrentar as águas geladas do lago. A Ana não deixou por menos e entrou também. E eu fiquei me prometendo, e a elas também, que seria o próximo a dar um mergulho. Mas enrolei, enrolei e acabei preferindo ficar seco e quentinho na praia mesmo. Enquanto isso, elas nadaram e se reenergizaram naquelas águas quase sagradas. Bem fizeram elas e se arrependimento matassem não estava aqui escrevendo essas linhas, hehehe.
A Rowan entra nas águas geladas do lago Fila Hua Hum, no parque Lanin, região de San Martín de Los Andes, na Argentina
A Ana e a Rowan nadam no lago Fila Hua Hum, no parque Lanin, região de San Martín de Los Andes, na Argentina
A Ana nas águas geladas do lago Fila Hua Hum, no parque Lanin, região de San Martín de Los Andes, na Argentina
Pouco mais de uma hora de deleite e estava na hora de voltarmos à estrada. Dirigimos de volta à nossa estrada de rípio original e rumamos para o norte, agora passando pelo lago Meliquina, mais inspiração para muitas fotos. Muitas fotos e curvas depois e chegávamos ao último lago do dia, o Lacar, justamente onde está San Martín de Los Andes, bem na seu extremo oriental. De longe já vimos a pequena cidade de 25 mil habitantes, uma espécie de Bariloche de antigamente, espremida entre o lago e as montanhas verdes atrás. Na baía, muitos barcos e veleiros. Esse era o nosso destino de hoje depois de um dia tão prazeroso de estradas e tantos lagos...
O belo cenário do lago Meliquina, no parque Lanin, região de San Martín de Los Andes, na Argentina
Chegando à San Martín de Los Andes, na Argentina
A praça central de Minas, no Uruguai
Aproveitamos nossa última manhã em Colonia del Sacramento para, pela internet, pesquisar, escolher e reservar um hotel na pequena e isolada Cabo Polonio, uma praia no Uruguai onde não se pode chegar de carro. Marcamos para a próxima quinta e sexta, portanto temos outros três dias para chegar até lá. Essa era nossa última preocupação para reservar hotéis aqui no país, já que nas outras cidades, teremos tempo e tranquilidade para definir nossa estadia no momento em que chegarmos. O pagamento, fizemos por um sistema que existe no Uruguai chamado Rede Pago, presente em todas as cidades. Pagamos aqui, em alguma casa comercial associada ao sistema e o dinheiro chega lá. Com esse assunto resolvido, hora de pegarmos estrada!
Antes de seguirmos para a praia, ainda queríamos passar no interior do país, em uma das poucas regiões de serra do Uruguai. Quando estamos explorando um país, é claro que gostamos de conhecer suas atrações mais conhecidas. Mas sempre procuramos também alguma região ou cidade desconhecida dos turistas. Quase sempre, é aí que chegamos mais perto da alma do país e de seus habitantes. Para descobri-lo, alguma pesquisa na internet, livros-guia e, principalmente, conversas com os habitantes locais. Normalmente, é daí que saem as melhores ideias. E foi assim que surgiu o nome de Minas. Mineiro que sou, já simpatizei logo de cara. Depois, ao descobrir que se tratava de uma região de serra, aí me decidi de vez! É para lá que vamos! Quem sabe, achamos até uma cachoeira e uma goiabada?
Chegando à fábrica da Patricia, a mais popular cervejaria do uruguai, na região de Minas, no sul do país
Cervejaria Patricia, estrategicamente construída ao lado do parque Salus, fonte da melhor água mineral do país, na região de Minas, no Uruguai
Minas fica a nordeste de Montevideo, na direção do interior. Nosso caminho de Colonia até lá não passa pela capital, desviando-se um pouco antes. São quase 300 quilômetros, ou cerca de três horas nas sempre tranquilas estradas uruguaias. Mas não fomos diretamente. Um pouco antes, paramos no parque Salus, onde está a principal fonte de água mineral do país. Aliás, é esta a água que bebemos em todo o Uruguai, a marca Salus, tão comum em restaurantes e supermercados. Uma boa maneira de começar a compreender um país é exatamente em seus supermercados, observando quais as marcas mais populares, de água a chocolate, de sabão em pó a cerveja. Aqui no Uruguai, a água é Salus e Salus é aqui de Minas. Aliás, o próprio nome da região e da cidade, Minas, refere-se às minas de água presentes nessa região serrana.
Chegando ao parque Salus, de onde vem a famosa água do país, na região de Minas, no Uruguai
Nós chegamos ao parque esperando encontrar uma das “instituições” uruguaias, mas, ao invés disso, encontramos duas delas! Isso porque, além da engarrafadora de água mineral, ali também está instalada a fábrica da Patrícia, a cerveja mais popular do Uruguai. Como todos sabemos, o principal ingrediente de uma cerveja é a água e a Patricia foi esperta o suficiente para fazer sua fábrica justamente ao lado da fonte mais saudável de seu principal ingrediente! Realmente, esse parque vale ouro para o país, hehehe!
A fonte de água mineral Salus, na região de Minas, no Uruguai
bebendo a água direto da fonte! No parque salus, região de Minas, no Uruguai
Nós não entramos na fábrica da Patricia e nos contentamos em fotografá-la de fora. Depois, fomos até a engarrafadora Salus. Com nossas garrafas em mãos, seguimos até a fonte pública e ali nos abastecemos da mais pura água uruguaia. Aproveitamos também para dar um bom passeio nos bosques e jardins do parque, repleto de flores. Não sei o quão popular é o parque entre os habitantes locais, mas hoje, uma segunda-feira, éramos só nós por ali, aproveitando o ar puro, água fresca, sombra e visual florido.
Muitas flores nos bosques e jardins do parque Salus, na região de Minas, no Uruguai
Muitas flores nos bosques e jardins do parque Salus, na região de Minas, no Uruguai
Depois do parque, rumo a Minas. É uma cidade pequena, cercada por serras e centrada em uma grande praça. Mais ou menos como o livro guia havia dito, “o principal charme dessa cidade pequena é exatamente ser uma cidade pequena”. Não sei se influenciado pelo nome, mas a minha sensação era a de estar em alguma cidade no interior da minha Minas Gerais. A praça, bem arborizada, está em frente à maior igreja da cidade. Ali do lado também está o principal hotel, o banco (no caso, não é o banco do Brasil, como seria, se estivéssemos mesmo em Minas Gerais), algumas lojas e restaurantes. Entre eles, o mais famoso de Minas. Na verdade, uma confeitaria, a Irisarri. Puro charme e tradição, foi aí que nos refestelamos em suas guloseimas, quando passamos pela cidade no dia seguinte. Não tinha a minha goiabada, mas o que não faltava em seus balcões eram doces. Respeitando as devidas proporções, vir a Minas e não parar na Irisarri é como ir ao Vaticano e não ver o papa!
Muitas flores nos bosques e jardins do parque Salus, na região de Minas, no Uruguai
Muitas flores nos bosques e jardins do parque Salus, na região de Minas, no Uruguai
Por fim, como não poderia deixar de ser, uma estátua adorna o centro da praça. Ela faz uma homenagem a uma batalha ocorrida a quase 190 anos, nos campos de Sarandi, não muito longe daqui. Outra vez, precisamos nos acostumar com a ideia de que, aqui no Uruguai, pelo menos na história, nós brasileiros somos os vilões. A batalha de Sarandi foi o primeiro grande combate entre os valentes uruguaios que buscavam sua independência e o exército imperial opressor dos brasileiros. O ano era 1825 e o resultado da batalha foi uma vitória acachapante uruguaia.
Muitas flores nos bosques e jardins do parque Salus, na região de Minas, no Uruguai
O Uruguai havia sido ocupado por tropas luso-brasileiras oito anos antes e seu herói nacional, o general Artigas, vencido e expulso para o Paraguai. A jovem nação tinha sido rebaixada e rebatizada como Província Cisplatina. Com a independência brasileira em 1822, o vasto Império do Brasil ia do Oiapoque ao Rio da Prata, uma promissora nação destinada a se tornar potência mundial. Mas sua fronteira sul enfrentava problemas e a também nascente nação argentina não se conformava com a perda dos territórios da Banda Oriental, como era conhecido Uruguai entre eles. O nome vinha do fato de se referir às terras situadas na margem oriental do rio Uruguay.
Estátua homenagenado a batalha de Sarandi, primeira grande vitória uruguaia na guerra de libertação contra as forças imperiais brasileiras, em 1825 (na praça central de Minas, no Uruguai)
Em 1825, um grupo de homens conhecido como os “Treinta y Tres Orientales” atravessaram o rio Uruguay, vindos de Buenos Aires e liderados por Lavalleja, e desembarcaram na Província Cisplatina. O intuito era iniciar a guerra de liberação do país. Rapidamente, as vilas do interior do Uruguai foram liberadas e as duas principais cidades do país, Montevideo e Colonia del Sacramento, cercadas. As tropas imperiais reagiram, uma coluna de 1.000 homens entrando na província rebelde vindos do Rio Grande do Sul e outra coluna de mesmo tamanho partindo da capital uruguaia rumo ao norte, para se juntar a seus compatriotas. Por mais que as tropas rebeldes de Lavalleja fustigassem as duas colunas, não conseguiram impedir que elas se encontrassem nas proximidades de Sarandi. Os revoltosos decidiram então, num ato de grande valentia, dar cabo desse grande exército reunido, num só golpe.
Estátua homenagenado a batalha de Sarandi, primeira grande vitória uruguaia na guerra de libertação contra as forças imperiais brasileiras, em 1825 (na praça central de Minas, no Uruguai)
Foi exatamente o que ocorreu em 12 de Outubro de 1825. Forças de tamanho similares se enfrentaram nos campos de Sarandi e, talvez pegos de surpresa pelo ataque impetuoso e inesperado, o exército brasileiro foi fragorosamente derrotado. Entre os dois mil combatentes imperiais, houve 400 mortes e outros 400 feitos prisioneiros, enquanto as baixas uruguaias ficaram em apenas 10% dessas cifras. A vitória catapultou a rebelião e, em breve, quase todo o território uruguaio estava em suas mãos. A última região a cair foi o nordeste do país, restando apenas as cidades de Montevideo e Colonia, que permaneceram sob cerco terrestre, mas sob domínio brasileiro, até o final da guerra, três anos mais tarde.
Gravura sobre a batalha de Sarandi, a primeira grande vitória dos uruguaios contra as tropas imperiais brasileiras, em 1825
As derrotas terrestres eram contrabalançadas pela superioridade naval do Império do Brasil. A ajuda escancarada dos argentinos na guerra fizeram com que o Brasil declarasse guerra àquele país e fizesse um bloqueio naval de sua principal cidade e porto, Buenos Aires. O cerco estrangulou a economia do país e, após três anos de hostilidades, o país vizinho estava pedindo água. Foi nesse impasse que a Inglaterra fez uso de sua poderosa diplomacia e “convenceu” os países beligerantes que a solução seria a criação de um terceiro país, o Uruguai. Nâo era esse o intuito inicial daqueles “33 orientales”, que sonhavam com uma república federalista e não centralizada, mas unida, de todas as províncias de língua espanhola na Bacia do Prata. Por fim, brasileiros ficaram felizes que o Uruguai não pertenceria à Argentina; argentinos ficaram felizes de ter seu porto liberado e que o Uruguai não pertenceria ao Brasil; uruguaios ficaram felizes de ter sua própria nação, livres do Império do Brasil e da Argentina de governo centralizado fortemente em Buenos Aires; e a Inglaterra ficou feliz de criar uma nação livre entre as duas maiores potências do continente e de mostrar ao mundo que ela ainda tinha força de exercitar sua diplomacia dentro do “quintal” da mais nova e emergente potência imperialista do mundo, os Estados Unidos e sua recém-criada doutrina Monroe (América para americanos).
Gravura sobre a batalha de Sarandi, a primeira grande vitória dos uruguaios contra as tropas imperiais brasileiras, em 1825. Eram 2 mil homens de cada lado e as tropas brasileiras sofreram mais de 400 mortes
Depois da aula de história, seguimos adiante. Minas não era nosso destino final hoje. Queríamos chegar verdadeiramente à região serrana do país e, para isso, precisávamos seguir mais alguns quilômetros. A pequena Villa Serrana e o Parque Salto del Penitente não estavam longe.
Almoçamos na Irisarri, a mais tradicional confeitaria de Minas, no Uruguai, uma verdadeira institução local
Visita à Universidade de Berkeley, na Califórnia, nos Estados Unidos
Uma coisa que sempre gosto de visitar em outros países são as universidades. Fujo um das hordas de turistas e me aproximo um pouco mais da vida local, das pessoas que realmente vivem por ali. O mesmo raciocínio vale para os mercados. Só que nesses a gente vê mais o povão, enquanto nas primeiras, a tendência é ver aqueles que formaram a elite do país, artística, econômica ou política.
Universidade de Berkeley, na Califórnia, nos Estados Unidos
Nos Estados Unidos, estão algumas das mais famosas universidades do mundo. A gente já tinha ido à Princeton e à Harvard, na costa leste, e aqui escolhemos dar uma passada em Berkeley. A universidade tem a fama de ser um dos centros mais liberais do país. Se a Califórnia já é tradicionalmente democrata, Berkeley seria a ala “xiita” do partido. Foi aqui que o movimento hippie teve mais força, onde protestos anti-guerra mais acontecem, onde a preocupação com um mundo verde é maior.
Uma das muitas bibliotecas da Universidade de Berkeley, na Califórnia, nos Estados Unidos
Só que, com a dificuldade de sair de San Francisco pela manhã e ainda querendo chegar ao Napa Valley no final da tarde, não sobrou muito tempo para vivenciarmos esse ícone da contra-cultura. Além disso, hoje é véspera do feriado de Thanksgiving e o campus não estava muito movimentado. Dos estudantes que ali encontramos, boa parte era chinesa. Será que são os únicos que se dispõe a continuar estudando no feriado?
A lua flutua sobre a torre do relógio, na Universidade de Berkeley, na Califórnia, nos Estados Unidos
Antes de entrar no campus, caminhamos pelas ruas ao redor, procurando um lugar para almoçar. Conforme imaginávamos, o que não faltava era lugar de comida natureba. Dezenas deles. Hoje, bem vazios, mas imagino que os mais de 30 mil estudantes da universidade formem uma freguesia constante! Depois, um passeio pelo campus cheio de áreas verdes e prédios tradicionais, como o da biblioteca e a torre centenária. Sempre gosto de me imaginar estudando nas universidades que visito, chegando de bicicleta, cumprimentando pessoas, preocupado com alguma prova, ansioso por alguma festa. Não foi diferente por aqui. Enfim, uma tarde rápida e gostosa, pensamentos ao léu. Mas o dever chama e, no nosso caso, o dever se chama “estrada”, Rumo ao próximo destino, ainda mais inspirador: o Napa Valley, a mais famosa região vinícola desse hemisfério.
Caminhando pelo campus da Universidade de Berkeley, na Califórnia, nos Estados Unidos
Falando em inspiração, foi o que sentimos quando chegamos de volta à Fiona, estacionada em frente à Universidade. Pela terceira vez nessa viagem, demos de cara com um bilhete escrito e deixado ali, no vidro do carro. São pessoas que, ao se deparar com o carro, ficam interessadas, acessam o site e, inspiradas, nos deixam alguma mensagem. E aí, quem fica ainda mais inspirado somos nós! Muito obrigado a esse mais novo inspirador, diretamente da queridíssima Costa Rica, país para o qual retornaremos em breve!
Bilhete deixado no vidro da Fiona, enquanto passeávamos pelo campus de Berkeley, na Califórnia, nos Estados Unidos
Caminhando para a Vila Hippie em Arembepe - BA
Como sempre, acordamos cheios das melhores intenções para um dia com programação intensa, repleto de atrações. Como sempre, levantamos um pouco mais tarde que tínhamos previsto, enrolamos um pouco mais na gostosa casa da Mônica, navegamos um pouco mais na internet. Como sempre, saimos tarde demais para tudo o que pretendíamos, mas confiando no nosso poder de adaptação...
Piscina natural em Arembepe - BA
Rumamos em direção ao norte. Passamos pela bonita Itapoã, da música de Vinícius. Nem paramos para fotos. Nossa intenção, como ensina a música, era passar o fim de tarde por lá, com tempo para fotos, caminhada e cerveja. Fomos direto para Arembepe, pouco mais de 20 km ao norte. Na pacata e simpática vila está um dos melhores restaurantes de comida baiana do estado (e provavelmente do mundo!), o Mar Aberto, bem em frente ao mar e a uma piscina natural formada pelos recifes. Como já chegamos tarde por lá, resolvemos ir direto para o almoço. Sábia decisão! Comemos um Bobó de Camarão absolutamente divino que justificou a fama do restaurante! Ali do lado, um empresário baiano recebia capitalistas japoneses, uma conversa em inglês com sotaques nipônicos e baianos. Apaixonado pelo que via, o chefe dos japoneses já avisou seus subordinados: "Vocês voltam, eu fico por aqui!"
Restaurante Mar Aberto, em Arembepe - BA
De barriga bem forrada, seguimos à pé, pela praia, para a famosa Vila Hippie, frequentada no início dos anos 70 por Janis Joplin e Mick Jagger. Supostamente, uma caminhada de menos de três quilômetros. A maré cheia e praia de tombo, linda de se ver, não colaboravam com a caminhada, mas a distância não era longa. Pois é, não era para ser...
O Atracadouro, próximo à Arembepe - BA
Ocorre que eu não vi a entrada da vila e acabei levando a Ana muito mais longe, quase 6 km de caminhada. Chegamos em Emissário. Quando subimos o barranco na esperança de ver a Vila Hippie, vimos um centro de farofa. A música, ao invés do esperado reaggezinho, era um sertanejo ao volume máximo. Imagine a minha decepção e o humor da Ana, depois da árdua caminhada.
Explorando a Vila Hippe em Arembepe - BA
Choupana na Vila Hippie em Arembepe - BA
Fazer o quê? Voltamos três quilômetros pela praia, até a sede do Projeto Tamar que eu não deixei a Ana entrar na ida e lá estava a Vila Hippie. Eu tinha estado lá há quase 20 anos e a impressão que tive foi a mesma de hoje: um lugar de vida simples e gente feliz mas que, de alguma maneira, parece meio fora do tempo, meio caído. Se bem que as choupanas hippies estão cada vez mais chiques, parecendo verdadeiros castelos de palha e taipa. Existe um pouco mais de uma dezena delas e não se pode construir mais. Para ir morar lá. é preciso esperar que alguém queira sair e desocupe sua choupana. Os novos moradores logo tratam de aumentar mais um pouco a choupana e, deste modo, elas foram crescendo.
Roda de Capoeira em Arembepe - BA
Com essa andança toda, ficamos com pouco tempo para ficar lá. Logo caminhamos mais um pouco para chegar em Arembepe, à tempo de, bem no finzinho da tarde, assistir a uma bela roda de capoeira, batismo dos novos alunos, na praça central. Foi jóia!
Roda de Capoeira em Arembepe - BA
Muito trânsito e algumas erradas depois, chegamos de volta à casa de Mônica. Junto com ela e com a Yasmim, a filha caçula, fomos todos jantar na marina, um bonito lugar cheio de restaurantes bem na beira da baía. Escolhemos comer na Fiona (uma pizzaria), por motivos óbvios!
Com a Lívia, na night no Tom do Sabor, em Rio Vermelho, Salvador - BA
Depois, já perto da meia noite, fomos encontrar a Lívia, a filha do meio, no Rio Vermelho, uma espécie de Vila Madalena de Salvador. Numa sexta-feira, estava bombando, dezenas de bares e restaurantes. Muito jóia! Nós fomos no Tom do Sabor, que apresentaria uma banda de marchinhas de carnaval. Hehehe, o povo daqui já está começando a esquentar para o carnaval. E ainda é Novembro! Fo muito legal, a Lívia estava com amigos e pudemos conviver e ver mais da juventude soteropolitana. Cada vez sou mais fã do sotaque daqui! A noite e e as marchinhas de carnaval foram longe e chegamos em casa com o sol raiando, o que em Salvador significa um pouco antes das cinco da manhã.
Cantando e dançando no final de tarde em Arembepe - BA
Depois de quase 40 km de trilhas pelas montanhas peruanas, a emoção de se chegar a Machu Picchu, no Peru (foto de Julho de 1990)
Ao iniciarmos nossos 1000dias por toda América, vários locais do continente estavam em nossos planos. Um deles eram as ruínas de Machu Picchu, no Peru, um dos principais pontos turísticos da América do Sul, já há mais de um século. Para chegar até lá, não há dúvidas que a maneira mais charmosa é caminhando pela famosa Trilha Inca. São quase 40 quilômetros de caminhada através das montanhas e vales da região, partido do quilômetro 82 (ou do 88) da ferrovia que liga Cusco à Agua Calientes e chegando no Portão do Sol, na parte superior de Machu Picchu.
Uma foto das ruínas de Machu Picchu, no Peru, em 1911, logo depois de serem reveladas para o mundo pelo explorador americano Hiram Bingham. A vegetação ainda cobre as ruínas
Um ano após ser revelada ao mundo em 1911, a vegetação já havia sido retirada das uínas de Machu Picchu, no Peru. Mais tarde, muita coisa foi reconstruída
A maior dificuldade é conseguir comprar o ingresso para fazer essa trilha. A demanda é infinitamente maior do que a oferta, pois o governo peruano impôs um limite de acessos na trilha. São quinhentas pessoas por dia, aí incluídos os guias e carregadores de cada grupo. Já faz tempo que, para fazer a trilha, é obrigatório estar em um dos grupos oferecidos pelas diversas agências de turismo da região. Nada de caminhadas “independentes”. Então, para turistas mesmo, acabam sobrando pouco mais de 200 vagas diárias. Durante os meses de inverno, melhor época para se fazer a trilha por causa das condições meteorológicas, os concorridos ingressos se esgotam com muitos meses de antecipação. É preciso comprar para uma data específica e estar lá no dia. Se atrasar, o ingresso é perdido. Além disso, ele é intransferível e tem de ser comprado pela própria pessoa. Para nós, que viajávamos de carro e sem uma agenda precisa, foi impossível prever a data que chegaríamos a Cusco e, portando, não tivemos a chance de comprar ingressos e fazer essa trilha icônica.
O explorador americano Hiram Bingham nas ruínas de Machu Picchu, no Peru, em 1912, quando a vegetação original começou a ser retirada
Nós não fizemos a trilha, mas isso não nos impediu de visitar as famosas ruínas, como pode ser visto aqui (1a Parte) e aqui (2a Parte). Ficou mesmo faltando a trilha, embora tenhamos feito uma outra, maravilhosa, até as ruínas de Choquequirao (posts aqui). Mas a tradicional trilha inca, esta ficou mesmo para trás. A mais triste com isso foi a Ana. Ela já havia viajado para cá antes, em 2006, e tinha comprado o ingresso para a trilha com bastante antecipação. Mas dificuldades no emprego a fizeram adiar sua viagem por alguns dias e ela perdeu seu ingresso. Agora, nos 1000dias, tinha esperanças de finalmente conhecer esse caminho, mas também não foi dessa vez. Quanto a mim, eu também já havia estado aqui, mas bem antes. Foi durante uma viagem com um primo e um amigo, em 1990, nosso primeiro mochilão pela América Latina. Já contei em outros posts alguns pedaços dessa viagem de 23 anos atrás, nossa experiência no Trem da Morte e nossa subida ao monte Chacaltaya, perto de La Paz. Agora, chegou a vez de relatar nossa experiência na Trilha Inca, algo que não poderia ficar de fora do site dos 1000dias.
Cruzando a famosa ponte sobre o rio Urubamba, no quilômetro 88 da ferrovia para Aguas Calientes onde se inicia o caminho inca para Machu Pichu (foto de Julho de 1990)
A famosa ponte sobre o rio Urubamba, no quilômetro 88 da ferrovia para Aguas Calientes onde se inicia o caminho inca para Machu Pichu (foto de Julho de 1990)
A chamada “Trilha Inca Tradicional” era um dos muitos caminhos usados pelos incas para se chegar a Machu Picchu. Em uma boa parte do caminho, ainda se percebe o calçamento original, com quase 600 anos de idade, subindo e descendo morros e atravessando florestas. Ao longo da trilha, passamos em várias ruínas daquela época, antigos templos, fortes, quartéis e povoados. A trilha deveria ser movimentada naquelas tempos! Mas, com a conquista espanhola e a destruição da civilização incaica, tudo isso quase se perdeu. Congelado no tempo e encoberto pela vegetação, esse antigo caminho, assim como a própria Machu Picchu, só reapareceriam para a civilização no início do século XX. Guiado por um menino local de apenas 11 anos, o explorador americano Hiram Bingham chegou a Muchu Picchu em 1911, através do vale do rio Urubamba até a atual Aguas Calientes e, de lá, morro acima até a antiga cidadela inca.
Altimetria do caminho inca a Machu Picchu, no Peru. Nós dormimos logo no início da trilha e depois, foram dois dias de caminhada e mais a manhã do 3o dia. Na época, o uso de guias não era obrigatório
Outros europeus já haviam estado lá antes, mesmo no séc. XIX, mas nenhum havia dado publicidade ao fato. Para quem vê Machu Picchu hoje, é difícil imaginar porque alguém chegaria até lá e não avisaria o resto do mundo, de tão espetacular que ela é. Mas, quando esses primeiros exploradores lá chegaram, Machu Picchu estava muito diferente do que conhecemos hoje, quase completamente coberta pela vegetação e com boa parte de suas construções desmontadas. Fotos antigas nos dão uma ideia de como era. Mas Hiram Bingham sabia muito bem o que se escondia por lá e, com a ajuda da National Geographic, limpou o terreno e mostrou ao mundo uma das maiores descobertas arqueológicas do século XX. Aos poucos, a cidade foi sendo “remontada” e virou o que conhecemos hoje. Foi Bingham também que explorou os caminhos que chegavam à cidade, incluindo a trilha inca tradicional e as ruínas ao longo da rota.
O Marcelo chega a Yuncachimpa, a 3.200 metros de altitude, no nosso primeiro dia de caminhada na trilha inca para Machu Picchu, no Peru (foto de Julho de 1990)
Llulluchapampa, a mais de 3.800 metros de altitude, ao final do nosso primeiro dia de caminhada na trilha inca que leva a Machu Picchu, no Peru (foto de Julho de 1990)
A partir de então, Machu Picchu foi ficando mais e mais popular no turismo mundial, atraindo gente como Che Guevara, ainda bem antes de se tornar um revolucionário. Primeiro foram as ruínas da cidade e, mais tarde, o próprio Caminho Inca atraia visitantes dos quatro cantos do mundo. Mas a situação política do Peru se deteriorou muito entre as décadas de 70 e 80 do século passado e a atuação de grupos terroristas no país afastavam muitos visitantes. Ente eles, talvez o mais sanguinário da história do nosso continente, conhecido pelo pomposo nome de Sendero Luminoso. Sua área de atuação mais forte era na região de Ayacucho e, mais tarde, na periferia da capital Lima. A região de Cusco, onde está Machu Picchu, era mais tranquila, mas no final da década de 80 não se podia seguir por terra, diretamente, de Cusco a Lima. Era muito perigoso. A alternativa era voar, ou então, dar uma longa volta por Arequipa. Foi nessa época que viajamos ao país e, de Cusco, tomamos a rota por Arequipa. Nos quase 20 dias que passamos viajando no Peru daquela época, diversas vezes acompanhamos, pelos jornais, os estragos feitos pela guerrilha, tanto pelos maoístas do Sendero Luminoso como pelos trotskistas do Tupac Amaru.
No acampamento ao final do primeiro dia de caminhada no caminho inca que leva a Machu Picchu, no Peru. aos 3.800 metros de altitude, chegamos bem próximos da linha da neve e gelo!(foto de Julho de 1990)
Enfim, muita gente deixava de viajar ao Peru por medo da violência. Para quem vinha, tudo era mais tranquilo e menos concorrido. Por exemplo, as atrações de Cusco, Machu Picchu e a trilha inca. Naquela época, não era preciso fazer reserva e muito menos era obrigatório a contratação de guias. Nós simplesmente pegamos o trem depois de visitar Ollantaytambo e descemos no quilômetro 88, já no final da tarde. Atravessamos a ponte pênsil sobre o rio Urubamba e fomos comprar nossos ingressos. Havia dois tipos, um na moeda nacional e outro em dólar. Valiam a mesma coisa. Na moeda americana, eram 13 dólares. O guarda nos disse que só tinha os ingressos em moeda nacional, mas nós só tínhamos dólares. Criou-se um impasse, mas ao final ele nos deixou entrar sem ingresso mesmo, com a promessa de pagarmos quando chegássemos a Machu Picchu. Como “garantia”, anotou nossos nomes e números de passaporte. Imagina só isso, comparando com a situação de hoje, super controlada.
Perto dos 3.500 metros de altitude nas montanhas peruanas, trecho final do nosso primeiro dia de caminhada no caminho inca que leva a Machu Picchu, no Peru (foto de Julho de 1990)
Todo o esforço para vencer os metros finais para se chegar aos 4.200 metros de altitude do 1o Paso, o ponto mais alto do caminho inca até Machu Picchu, no Peru (foto de Julho de 1990)
Essas regras mais rígidas de hoje e os preços muito maiores tem sua razão de ser. O fato é que se ainda fosse tudo liberado, seriam milhares de pessoas diariamente e a trilha simplesmente não comporta isso. A obrigatoriedade de guias também ajuda a controlar o comportamento dos turistas, cuidando do lixo deixado para trás ou locais autorizados de acampamento, por exemplo. Daquela vez, naquele trem vespertino, só disseram ali oito pessoas. Nós, dois amigos brasileiros e três gringos. No trem matutino vinha mais gente, mas não tanto. Hoje, como já disse, são 200 turistas diários, mais guias e carregadores até o limite de 500 pessoas. Nos meses de inverno, sempre se chega a este número. O caminho não é difícil de ser seguido e poderia ser feito tranquilamente, como nós fizemos, sem guias. É claro que eles agregam muito em informação, mas o caminho é bem claro e com pouquíssimas bifurcações. Já os carregadores, bom, nenhuma dúvida que é muito mais confortável caminhar sem peso e já encontrar sua barraca armada, como em qualquer outra trilha. Aqui, ainda mais pela dificuldade da altitude. Para quem não está acostumado, chegar aos 4 mil metros caminhando é um esforço descomunal, ainda mais com peso nas costas. Mas com jeitinho e paciência, vai.
No manhã do segundo dia de caminhada, cruzando o 1o Paso, ponto mais alto do caminho inca que leva a Machu Picchu, no Peru. Conhecido como Warmiwañusca, ou "mulher que dorme", está a 4.200 metros de altitude! (foto de Julho de 1990)
Ir em grupos com agências, como já disse, hoje não é mais uma opção, mas uma obrigatoriedade. Sem peso e medo de errar o caminho, sobre muito mais tempo para aproveitar a trilha, sem dúvidas. Com barracas armadas e comida quentinha, então, nem se fala. São ótimas vantagens. A desvantagem é o preço muito maior e a perda de liberdade. Afinal, temos de seguir no ritmo do grupo. As agências oferecem os passeios em 4 ou 5 dias, já começando a caminhar na metade do primeiro dia. Nós, que normalmente caminhamos mais rapidamente e que tínhamos um país inteiro para conhecer em 20 dias, fizemos mais rapidamente. Paramos em pontos onde hoje não se pode mais acampar. Começamos bem cedo no primeiro dia e, ao final do segundo, já estávamos quase lá. Tudo calculado para, na manhã do terceiro dia, sermos os primeiros a chegar nas ruínas, antes das hordas de turistas que sobem de ônibus de Águas Calientes. Naquela época, para quem vinha de baixo, a cidade só abria às nove horas. Hoje, abre às seis da manhã. Afinal, agora são quase 2.500 pessoas diárias vindas de Aguas Calientes e naquela época era menos da metade disso.
No manhã do segundo dia de caminhada, cruzando o 1o Paso, ponto mais alto do caminho inca que leva a Machu Picchu, no Peru. Conhecido como Warmiwañusca, ou "mulher que dorme", está a 4.200 metros de altitude! (foto de Julho de 1990)
No alto do 2o Paso, a 3.850 metros de altitude, no nosso 2o dia de caminhada na trilha inca que leva a Machu Picchu, no Peru (foto de Julho de 1990)
Bom, como disse, atravessamos a ponte e entramos na trilha bem no final de tarde. Armamos nossas barracas ali mesmo, já ficando escuro. No outro dia, saímos cedinho, através de uma mata gostosa, sempre perto de um afluente do Urubamba. Demorou mais de uma hora para chegarmos ao início da subida e, antes disso, para minha surpresa, até passamos perto de um pequeno povoado. Sempre achei que ninguém morasse por ali, mas mora sim. Então, o “trânsito” que encontramos, ao menos naquela época, é muito mais de pessoas locais do que turistas. Esses só começamos a ver a partir da subida, os retardatários do grupo que chegou no trem matutino do dia anterior. Raro é encontrar alguém vindo no sentido contrário. Quase sempre é algum morador local, mas há também o caso de turistas que se deram mal com a altitude e desistiram do caminho, tendo de retornar para pagar o trem novamente.
Na tarde do 2o dia de caminhada, chegando às ruínas de Sayacmarka, aos 3.600 metros de altitude, no caminho inca que leva a Machu Picchu, no Peru (foto de Julho de 1990)
Nesse dia, como mostra o mapa de altimetria nesse post, nós não paramos mais de subir e fomos até o último ponto de acampamento antes do chamado 1º Paso. “Paso” é o nome que se dá quando chegamos no alto de uma grande subida ou de um vale e começamos a descer do lado de lá, já em outro vale. São três “passos” ao longo da trilha e o mais alto deles é justamente o primeiro, com 4.200 metros de altitude. Nós seguimos até um lugar chamado Llulluchapampa, a 3.800 metros de altura. A mochila nas nossas costas pesava uma tonelada, mas aquela experiência no Chacaltaya, em La Paz, já tinha nos deixado muito mais acostumados com a altitude. Além disso, os dias no Titicaca, Puno e arredores de Cusco também foram acostumando nossos organismos. Se tivéssemos chegado diretamente do Brasil, duvido que tivéssemos conseguido seguir no ritmo que viemos. Aí acampamos, apenas nós e os conhecidos brasileiros, duas barracas no meio daquele mundão todo, solo sagrado dos incas. Foi muito legal mesmo. Estávamos bem próximos da linha de neve e a vista do vale era alucinante.
Em Phuyupatamarca, o 3o paso, aos 3.650 metros de altitude, quase ao final do nosso 2o dia de caminhada na trilha inca que leva a Machu Picchu, no Peru (foto de Julho de 1990)
Mais uma vez, acordamos cedo no dia seguinte, o mais duro da nossa caminhada. O primeiro e maio obstáculo foi chegar no alto do 1º Paso. Um sacrifício danado, recompensado pelo ar puro e gélido da manhã e a vista incrível que se tem durante o caminho. Mas foi mesmo um sufoco e se houvesse um carregador por ali, acho que eu me renderia. Mas tudo melhora quando chegamos no alto e começamos a descer. A única tristeza é ver a trilha descendo até lá embaixo e voltando a subir no morro seguinte. Será que esses incas não sabiam fazer pontes, hehehe! Nós descemos e subimos novamente, agora até o alto do 2º Paso, a 3.850 m de altitude. Onde houvesse alguma ruína, e são várias, aí parávamos para descansar e, algumas vezes, comer algo. O dia foi passando e foi a vez de vencermos o 3º Paso, o mais baixo e último da trilha. A partir daí, só descida nos esperava. Estávamos a 3.650 metros de altura e Machu Picchu. 1.200 metros abaixo de nós. mas ainda tínhamos uma última noite antes de chegar lá.
Trecho final da longa caminhada do 2o dia, já abaixo dos 3 mil metros e de volta ao trecho de mata, chegando a Intipata, no caminho inca que leva a Machu Pichu, no Peru (foto de Julho de 1990)
Trecho final da longa caminhada do 2o dia, já abaixo dos 3 mil metros e de volta ao trecho de mata, chegando a Intipata, no caminho inca que leva a Machu Pichu, no Peru (foto de Julho de 1990)
A descida até Wiñaywayna foi tão ou mais complicada que as subidas anteriores. Cansados e com peso nas costas, os joelhos vão para a cucuia. E foram mesmo, especialmente os do Marcelo. Existe um pequeno hotel por ali e eu cheguei junto com o Haroldo no final de tarde. Mas o Marcelo não aparecia e o Haroldo subiu ao seu encontro, Ele vinha manquitolando, com dores no joelho, e o Haroldo até trouxe sua mochila. Já o pequeno hotel, estava lotado por uma excursão de baianos de Salvador. Nós estávamos com muita preguiça de montar a barraca e acabamos por dormir no quarto deles, no chão, com nossos sacos de dormir. De graça. Só pagamos pelo café da manhã no dia seguinte. E ainda pudemos sair com muito mais agilidade, pois a barraca já estava dentro das mochilas.
Passando por Intipata (2.750 m) e a caminho de Wiñaywayna (2.550 m), local da nossa última noite na trilha inca que leva a Machu Pichu, no Peru (foto de Julho de 1990)
O último trecho fui curto, mas emocionante. Afinal, estávamos chegando em Machu Picchu. No nosso ritmo quase correndo, fomos os primeiros a chegar e a cidade estava linda, recém iluminada pelo sol e totalmente vazia. Depois das fotos do mirante e de um lanche admirando um dos mais belos cartões postais do mundo, a gente desceu até as ruínas para explorá-las um pouco antes que chegassem os turistas de Agua Calientes. Hoje, os caminhos pelas ruínas são super restringidos, um corredor único e com guardas a nos vigiar. Naquela época, perambulava-se livremente, exceto em cima dos muros. Foi uma delícia me deitar sob a sombra de uma árvore no meio de uma das praças principais da cidade e ficar só lá, divagando e curtindo o momento. Essa mesma árvore continua por lá, mas hoje é completamente off-limits para turistas. Apenas as lhamas caminham livremente pelos gramados de Machu Picchu no século XXI.
Manhã de sol, um pouco depois das oito horas, uma Machu Picchu ainda vazia nos recebe em nosso 3o dia de caminhada pela trilha inca, no Peru (foto de Julho de 1990)
Hoje entendo e concordo completamente com as limitações impostas pelo governo. Mas, ao mesmo tempo, agradeço aos céus a chance que tive 23 anos atrás de ter feito aquela trilha no meu ritmo e quase sem cruzar com outras pessoas, além de poder caminhar livremente pelas praças e ruelas de Machu Picchu. O progresso tem suas vantagens, mas tem também seus custos...
Uma Machu Picchu livre de turistas nos recebe na manhã do nosso 3o dia de caminhada pela trilha inca, no Peru (foto de Julho de 1990)
P.S Para quem se interessar, os relatos dessa viagem de 1990 que estão no site dos 1000dias são:
1 - A viagem no Trem da Morte
2 - A subida do Chacaltaya, em La Paz
3 - A Trilha Inca até Machu Picchu (este post!)
4 - Viajando pelo rio Amazonas do Peru ao Brasil
Na trilha entre Caiera e a praia de Naufragados, no extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina
No dia 18 foi a vez de seguirmos pela primeira vez para o sul da ilha, pelo menos nessa passagem dos 1000dias por Florianópolis e Ilha de Santa Catarina. Como já disse nos posts anteriores, eu e a Ana já viemos muitas outras vezes para cá, aproveitando o fato de Curitiba estar a apenas 300 quilômetros (por boas estradas) da capital catarinense. Na maioria das vezes, concentramos nossas estadias na parte sul da ilha, onde estão nossos bairros e praias preferidos de Florianópolis. Mas mesmo o sul da ilha tem suas diferenças e a parte que melhor conhecemos é aquela voltada para o oceano, como o Campeche, o Matadeiro e a Lagoinha. Na costa voltada para o continente, estivemos algumas poucas vezes, especialmente para visitar o Ribeirão da Ilha. Ainda mais ao sul está a praia de Naufragados, onde só se chega de trilha ou de barco. Para mim, pelo menos até agora, era uma ilustre desconhecida, praticamente no topo da minha lista de lugares por conhecer na Ilha da Magia. A Ana sim, havia estado lá uma única vez, ainda na sua fase pré-Rodrigo.
Nossa rota no dia 18. São 22 km em direção ao sul, até o Ribeirão da Ilha e outros 13 kms, parte deles em estrada de terra, até Caiera, no final do caminho, de onde parte a trilha para a praia de Naufragados
Então, esse foi o nosso destino do dia: a charmosa freguesia do Ribeirão da Ilha e a trilha para a praia dos Naufragados, a mais austral de Florianópolis. São cerca de 22 quilômetros de estrada, passando pelo túnel e pelo aeroporto (onde termina a pista dupla), até o centrinho de Ribeirão da ilha e mais 13 quilômetros, um bom pedaço em estrada de chão, até Caiera, no final da rodovia. É daí que começa a trilha de uma hora até Naufragados e há vários estacionamentos para se deixar o carro. Nós fomos cedo, aproveitando o dia lindo que fazia, passamos rapidamente pelo Ribeirão da ilha e fomos curtir o dia na praia quase deserta. Depois, já no final de tarde e no nosso caminho de volta, paramos com mais tempo no charmoso distrito em busca de um de seus famosos restaurantes.
A trilha de Caieras até a praia de Naufragados, no extremos sul da ilha de Santa Catarina, município de Florianópolis. São cerca de 60 minutos de caminhada, quase sempre na sombra
O Ribeirão da Ilha é uma das mais antigas freguesias da área de Florianópolis, tendo sido fundada durante a primeira onda de povoamento da ilha, com a chegada dos imigrantes açorianos no final do séc. XVIII. A principal atividade econômica era a produção de alimentos para sustentar o forte militar construído poucas décadas antes com o intuito de proteger a entrada do estreito de mar que separa a Ilha de Santa Catarina do continente. É dessa época o início da construção do principal marco arquitetônico do bairro, a Igreja Nossa Senhora da Lapa. Ainda hoje, apesar de a parte interna ter passado por diversas reformas que descaracterizaram suas origens, seu exterior ainda permanece como fora na origem, puro charme açoriano.
A típica e charmosa arquitetura de inspiração açoriana no Ribeirão da Ilha, no sul de Florianópolis (foto da internet)
A típica e charmosa arquitetura de inspiração açoriana no Ribeirão da Ilha, no sul de Florianópolis (foto da internet)
Aliás, é a arquitetura presente no centro do Ribeirão da Ilha um dos principais atrativos para se vir até aqui. Casas coloridas e alegres e um ar colonial encantam os turistas e visitantes. Depois da confusão do centro de Florianópolis, a sensação é a de termos mudado de cidade e de tempo, um colírio para os olhos e um elixir para a alma.
A bela igreja de Ribeirão da Ilha, no sul de Florianópolis (foto da internet)
Um dos restaurantes famosos do Ribeirão da Ilha, no sul de Florianópolis (foto da internet)
Além da arquitetura, o outro motivo que atrai pessoas para cá é a famosa culinária do Ribeirão da Ilha. No bairro estão instalados alguns dos mais famosos restaurantes de Florianópolis e, certamente, aqueles com mais criatividade no nome. “Ostradamus”, “Umas e Ostras”, “Maria Vai com as Ostras” ou “Ostras e Ostras Coisas” já nos dão uma boa ideia da especialidade aqui do sul da ilha. Frutos do mar e principalmente as ostras, preparados das mais diferentes formas, são o prato principal de todos esses restaurantes. A produção dos mariscos é local, inúmeros “cercados” no mar, a poucos metros da praia, ao longo de quilômetros da costa. Enfim, quem vem para cá come ostras fresquinhas!
Deliciosas ostras recobertas com queijo derretido, iguaria típica do Ribeirão da Ilha, no sul de Florianópolis (foto da internet)
Criadouros de ostras e um belíssimo fim de tarde, visão comum no Ribeirão da Ilha, no sul de Florianópolis (foto da internet)
Eu, por exemplo, nunca fui fã de frutos do mar. Gosto de peixes, camarão, casquinha de siri e só. Nada de mariscos, caranguejos, lagostas, ostras, polvos e lulas. Reconheço a frescura e sei “abrir mão” dela nos lugares certos. Foi assim naquele delicioso restaurante japonês de Fortaleza, onde foi impossível recusar o prato com polvo, que estava uma delícia, sem nenhum gosto emborrachado de polvo. Foi assim também em Chiloé, no Chile. É inadmissível passar por lá sem experimentar o “curanto”, um prato que mistura muitas coisas, mas cujo forte são os mariscos. Bom, aqui no Ribeirão da Ilha, também seria um pecado não nos esbaldarmos em ostras, gostando ou não. Confesso que, com um queijinho gratinado em cima, ficou uma delícia. Eu só precisava esquecer meus preconceitos e me deliciar na iguaria. Foi o que fiz e recomendo para qualquer um que chegue até aqui. Junte-se a isso uma cerveja gelada e um entardecer sobre as água do estreito, eis aí a alma do Ribeirão da Ilha. No concurso de charme da ilha, acho que a única concorrência vem de Santo Antonio de Lisboa, também voltada para o continente, mas na costa norte de Florianópolis.
Na trilha entre Caiera e a praia de Naufragados, no extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina
A agradável trilha que leva à praia de Naufragados, no extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina
Bom, esse nosso final de tarde inesquecível no Ribeirão da Ilha foi no nosso caminho de volta. Na ida, passamos por aqui rapidamente, sem parar, em direção ao início da trilha para Naufragados. Com isso, perdemos a melhor luz para fotografarmos. Uma pena, pois a vila é super fotogênica! Na volta, escolhemos comer antes e, após o restaurante, já não conseguíamos fotografar nada. Que falha! Enfim, não foi difícil achar fotos na internet para ilustrar um pouco do Ribeirão da Ilha. Mas fica um amargo na boca de não termos nossas próprias fotos desse lugar tão especial...
Córrego de água limpa na trilha para a praia de Naufragados, no extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina
Riacho de água pura na trilha para Naufragados, no extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina
De qualquer maneira, boa parte do nosso tempo de hoje foi dedicada a outro programa: caminhar até a praia mais ao sul da Ilha de Florianópolis e curtir esse lugar tão isolado da civilização. O nome dessa praia misteriosa, Naufragados, já é eloquente o bastante para não deixar dúvidas sobre a sua origem, mas a discussão é sobre a qual naufrágio ele se refere. Isso porque foram vários nessa região, bem na entrada do estreito que separa a ilha do continente. O mais provável é que o nome faça referência a um terrível naufrágio, em 1753, de um barco que levava açorianos para o Rio Grande do Sul. Foram mais de cem mortos, boa parte deles enterrados nas areias dessa praia. Outros tantos sobreviveram ao desastre e viveram aqui até serem resgatados.
A isolada praia de Naufragados, no extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina
A isolada praia de Naufragados, no extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina
Os naufrágios na área só diminuíram com a construção de um grande farol, em 1883, na extremidade sul da ilha, em uma das pontas que delimitam a praia de Naufragados. Sem mais náufragos para movimentar a praia, desde então ela vive um período de grande tranquilidade, perturbado apenas pela chegada de intrépidos visitantes que chegam aqui caminhando ou de barco.
Farol na praia de Naufragados, no extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina
Extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina, praia de Naufragados
A trilha leva cerca de uma hora e está bem sinalizada e mantida. Parte de trás de um dos estacionamentos no final da estrada, começa com uma subida mais íngreme, mas logo fica plana, sombreada e muito agradável de ser percorrida. No caminho, passamos por córregos onde podemos nos refrescar e nos abastecer de água para beber. Ela é pura e cristalina e vem diretamente da maior montanha da ilha, o Morro do Ribeirão, com 532 metros de altitude. Fora da temporada e de finais de semana ensolarados, a trilha é sempre vazia, apenas uns poucos encontros fortuitos ao longo da caminhada.
Caminhando na praia deserta de Naufragados, no extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina
Caminhando na praia deserta de Naufragados, no extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina
A praia tem pouco mais de um quilômetro de cumprimento e é bem larga. Dali se vê o continente bem próximo, a menos de dois quilômetros de distância. A tentação para uma travessia a nado é grande, mas a corrente é bem forte, principalmente nas saídas e entradas de maré. Para quem tiver o bom senso de ficar mais perto da praia, o mar é bem tranquilo, uma delícia de mergulho.
Observando o mar na praia deserta de Naufragados, no extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina
Visual do extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina, praia de Naufragados
Quase não há construções. Umas poucas casas e o farol sobre o morro. Duas ou três casas foram transformadas em restaurantes que servem peixe, petiscos e, claro, cerveja gelada. A gente se instalou em um deles e ficamos bem amigos do Seu Adriano, o morador mais antigo da praia. Veio para cá na década de 50. É ele que mantém a trilha que tínhamos acabado de fazer em tão bom estado. Ótimo pastel e conversa deliciosa, muitos casos e causos.
Uma garça desfruta da solidão e tranquilidade da praia de Naufragados, no extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina
Uma garça desfruta da solidão e tranquilidade da praia de Naufragados, no extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina
Havia mais uns poucos visitantes, quase todos acampados para uma temporada mais longa. Nós caminhamos de um lado a outro da praia, areia firme e gostosa de andar. Nossa acompanhante foi uma garça curiosa que ficava posando para fotos.
Com o seu Adriano, morador pioneiro da praia de Naufragados, no extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina
Com o seu Adriano, morador pioneiro da praia de Naufragados, no extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina
É possível continuar a caminhada a partir daqui e seguir até o Pântano do Sul, praia já voltada para o oceano na costa leste da ilha, passando no caminho pelas praias do Saquinho e da Solidão. Dizem ser um caminho lindo, rota da famosa prova “Volta à Ilha”. A Ana já fez, mas eu ainda não. E, infelizmente, ainda não foi dessa vez. Afinal, daqui tínhamos de voltar para a nossa querida Fiona e para as ostras gratinadas que nos esperavam no Ribeirão da Ilha. Então, depois de muita conversa fiada com Seu Adriano, tratamos de pegar o caminho de volta. Com a certeza de que, um dia, voltaremos!
Deixando pegadas efêmeras nas areias da praia de Naufragados, no extremo sul de Florianópolis, Ilha de Santa Catarina
Segundo e derradeiro bilhete de Lampião para o prefeito de Mossoró, tentando extorquir os cofres da cidade, em memorial da Praça da Resistência, em Mossoró - RN
Depois da nossa passagem pelo Lajedo da Soledade viemos para Mossoró, a segunda maior cidade do estado. Região de intensa exploração de sal e de petróleo em terra. Há também algo do meu sangue por aqui. Avós de minha avó por parte de pai partiram daqui para o sul do país, há mais de 150 anos.
Toboágua no Hotel Termas de Mossoró, em Mossoró - RN
Além desses tênues laços familiares, três coisas nos atraiam a essa cidade: o irmão de uma grande amiga da Ana mora por aqui, as tradicionais águas termais de Mossoró e a violenta passagem de Lampião pela região.
Infelizmente, acabamos nos desencontrando do Alfredo, irmão da Juliana. Peça do destino. Até no nosso hotel ele foi, mas tínhamos acabado de sair. Ficar sem celular numa hora dessa não ajuda...
Olha a temperatura dessa piscina, no Hotel Termas de Mossoró, em Mossoró - RN
Quanto às águas termais, Mossoró tem um tradicional hotel, que fez 30 anos em 2009. É muito conhecido em todo o nordeste. Tem o sugestivo nome de Termas de Mossoró. Para dormir, era meio caro para o nosso bolso, mas podemos visitar seu parque aquático. E assim fizemos na manhã de hoje. Apesar de ser uma rara manhã chuvosa na cidade, o calor não dava tréguas. Assim, visitamos as piscinas que chegam a uma temperatura de mais de 50 graus, mas não animamos a entrar. Passeamos pelo hotel, tiramos fotos de sua sequência de piscinas e seguimos viagem rumo ao Ceará.
Lendo sobre Lampião, no memorial da Praça da Resistência, em Mossoró - RN
O ponto alto de nossa estadia na cidade foi a visita à Praça da Resistência, onde há um memorial muito bem feito relatando a história da invasão de Mossoró pelo bando de Lampião, em 1927. Nesta época, a cidade já contava com cerca de 20 mil habitantes e era a mais rica do estado. Lampião foi convencido por outros cangaceiros de que seria possível invadi-la e saqueá-la. Mesmo em dúvida, sua vaidade em comandar tal feito falou mais alto.
Maria Bonita, no memorial da Praça da Resistência, em Mossoró - RN
Tal empreitada não foi mantida em sigilo, o que deu tempo para que os incrédulos habitantes da cidade, liderados pelo valente prefeito, se preparassem para a batalha. Muitos dos habitantes foram retirados da cidade enquanto os outros foram armados e entricheirados. Mesmo assim, os cangaceiros não desistiram de seu intento. Dois bilhetes foram escritos para as autoridades. O segundo deles, pelo punho do próprio Lampião. Tentava extorquir a cidade, trocando uma grande soma de dinheiro pela não invasão de Mossoró.
Lampião novinho, no bando do cangaceiro Sinhó Pereira, em foto do memorial da Praça da Resistência, em Mossoró - RN
Toda a batalha é contada e demonstrada nos painéis informativos do memorial. Há também uma contextualização da época, da cidade, das personagens envolvidas e do próprio movimento do cangaço. Trabalho muito bem feito!
O resultado da batalha é que os cangaceiros foram exemplarmente rechaçados. A aura de invencibilidade do rei do cangaço ruiu por terra. Alguns dos mais valentes homens de Lampião foram mortos, ou então, feridos e depois assassinados. Entre eles, Jararaca, terrível cangaceiro que chegou a dar entrevistas depois de capturado. No dia seguinte, os policiais o mataram enquanto o transferiam para Natal, bem em frente ao cemitério de Mossoró. Acabou virando "santo" e motivo de peregrinação. Seu túmulo é o mais visitado da cidade, no dia de Finados.
Memorial da Praça da Resistência, em Mossoró - RN
Eu e a Ana fomos digerir todas as informações na night de Mossoró. Night de chuva, como há muito não se via na cidade. Coincidentemente, também foi num raríssimo dia de chuva que a batalha de 27 se desenrolou.
Nesta noite, a batalha fez parte dos nossos sonhos, hehehe. E hoje, após a visita às termas, deixamos o Rio Grande do Norte rumo ao Ceará. Mesmo caminho de Lampião em fuga, há 84 anos. No Ceará, terra de Padre Cícero, ele tinha mais amigos e era mais fácil se esconder e se recuperar do baque. Por mais dez anos ele andou pelo sertão. Mas aquela batalha perdida o colocou para sempre na defensiva. A valente Mossoró lhe deu uma lição de que nunca mais esqueceu: não atacar uma cidade com mais de uma torre. Mossoró tinha quatro!
As casas coloridas da cidade de Adícora, no litoral da península de Paraguaná, ponto mais ao norte da Venezuela
Para nós que somos tão acostumados com a geografia paranaense, o reflexo e a tentação de dizer “Paranaguá” era grande, mas era mesmo para “Paraguaná” que estávamos indo, uma pequena península com forma de cabeça humana que fica no extremo norte da Venezuela. Há poucas dezenas de milhares de anos, era mais uma das ilhas que pontuam a costa nesse ponto, como Aruba ou Curaçao, mas a combinação de correntes marítimas e ventos tratou de construir, ao longo do tempo, uma estreita ponte que a liga ao continente. A ilha virou península!
Península de Paranaguá, extremidade norte da Venezuela, quase encostando em Aruba! Nós passamos pelas cidades históricas no centro da península, pelo balneário de Adicora e nas lagoas coloridas do norte
Falando em Aruba, do alto da maior montanha de Paraguaná, em dias de céu limpo, se pode ver muito bem a ilha holandesa. Até parece que foi ontem que estivemos por lá, e não há 17 meses. A tentação de revê-la, mesmo que de longe, foi grande, mas o dia não estava tão claro assim e a caminhada até o alto da bela montanha iria requerer umas cinco horas, tempo que não tínhamos, infelizmente. Sem essa alternativa, poderíamos nos concentrar nas outras tantas atrações que Paraguaná oferece, como as vilas históricas, as lagoas coloridas repletas de pássaros avermelhados e o litoral dos sonhos para quem gosta de kite e wind surf.
O Cerro de Santa Ana, maior montanha da península de Paraguaná, ponto mais ao norte da Venezuela. Lá do alto, pode-se ver Aruba!
Foi a proximidade com as Antilhas Holandesas que marcou a história de Paraguaná. Por aqui passava o comércio, legal e ilegal, entre as ilhas e a Venezuela, desde os tempos de colônia até os de república. Ricas comunidades de comerciantes se estabeleceram e ainda hoje se pode admirar as pequenas vilas onde eles moravam. Esse foi o caminho que decidimos seguir, dando a volta pelo interior da península, passando ao lado do morro Santa Ana, o mais alto de Paraguaná e, finalmente, seguindo para o litoral e as lagoas coloridas.
Observando a igreja de Santa Ana, cidade histórica na península de Paraguaná, ponto mais ao norte da Venezuela
A igreja de Moruy, pequena cidade na península de Paraguaná, ponto mais ao norte da Venezuela
Cada uma das vilas tinha sua pracinha central e a charmosa igreja, entre elas algumas das mais antigas ainda de pé no país. Nós fomos fazendo nosso tour, tirando nossas fotos e fazendo as contas para controlar o combustível do carro. Principalmente agora que tínhamos decidido pelo caminho mais longo, para poder passar nas pequenas vilas. Estávamos bem no limite para podermos voltar até Coro quando descobrimos um pequeno posto ali mesmo. Melhor... com diesel! Finalmente, poderíamos abastecer pela primeira vez no país e ver com os próprios olhos como é encher o tanque gastando apenas 15 centavos de dólar. Atenção! Não estou falando do preço de um litro, mas de todos os litros necessários para encher o tanque da nossa Fiona.
Enchendo o tanque com 2,80 bolívares, ou 12 centavos de dólar, na península de Paraguaná, ponto mais ao norte da Venezuela
Praça central da pequena Santa Ana, cidade histórica na península de Paraguaná, ponto mais ao norte da Venezuela
O preço do combustível é uma das facetas do chavismo, bolivarianismo ou socialismo do século XXI, alguns dos termos usados para descrever o sistema político e econômico implantado no país por Hugo Rafael Chávez, o carismático e polêmico líder que governou a Venezuela por quase quinze anos, desde 1998 até sucumbir frente ao câncer no final do ano passado.
A igreja de Buena Vista, cidade na península de Paraguaná, ponto mais ao norte da Venezuela
Após uma pujante década de 70, alavancada pelos altos preços do petróleo, a Venezuela enfrentava uma grave crise econômica na década de 80, depois da derrocada dos preços do barril de óleo enquanto os gastos internos continuavam os mesmos. A Venezuela se endividou e não tinha como pagar seus débitos. Na campanha presidencial do final da década, o tradicional político Carlos Andrés Perez prometeu repelir políticas neoliberais de corte de gastos, mas assim que venceu e assumiu o governo, parece ter mudado de ideia e recorreu ao FMI. O trágico resultado foi um aumento da pobreza e descontentamento social que culminou com manifestações em Caracas, reprimidas com violência e que resultaram em mais de cem mortos.
Propaganda nos muros de Moruy, pequena cidade na península de Paraguaná, ponto mais ao norte da Venezuela
Foi nesse clima cada vez mais tenso que um até então desconhecido militar, o Coronel Chávez, tentou um golpe militar no início de 1992. Várias instalações militares foram tomadas no interior do país, mas o objetivo de capturar o presidente Andres Peres e tomar as principais bases da capital falharam. Chávez acabou desistindo do golpe, ordenando a rendição dos revoltosos e evitando um banho de sangue. Mas negociou em troca um pronunciamento na TV quando, enfim, tornou-se conhecido na nação e conseguindo a simpatia de amplos setores da sociedade, decepcionados com os níveis de corrupção e ineficiência então vigentes no governo.
Flamingos e culhereiros na Laguna de Tiraya, na península de Paraguaná, ponto mais ao norte da Venezuela
Culhereiros na Laguna de Tiraya, na península de Paraguaná, ponto mais ao norte da Venezuela
Mesmo preso, Chávez ajudou na organização de uma nova tentativa de golpe, no final daquele ano. Dessa vez, os revoltosos foram mais aguerridos e o número de mortes aumentou bastante. O governo conseguiu controlar a situação, mas o desgaste político era cada vez maior. Com forte pressão da sociedade, Carlos Andres Perez sofreu um processo de impeachment dois anos mais tarde.
Um culhereiro na Laguna de Tiraya, na península de Paraguaná, ponto mais ao norte da Venezuela
Nas eleições seguintes, foi eleito outro político tradicional, Rafael Caldeira. Entre as promessas de campanha, uma ampla anistia aos revoltosos de 1992. Promessa cumprida, Chávez e outros líderes foram postos em liberdade, mas impedidos de voltar ao exército. O governo de Caldeira também fracassou em melhorar a situação econômico-social da Venezuela e, nas próximas eleições, o agora político Chávez foi o grande vencedor. Agora de forma legal, chegava ao poder, com amplo apoio das classes menos abastadas, inclusive da classe média.
Culhereiro sobrevoa a Laguna de Tiraya, na península de Paraguaná, ponto mais ao norte da Venezuela
Chávez não perdeu tempo. Convocou eleições para uma assembleia constituinte e obteve uma grande vitória eleitoral para composição dessa assembleia. Em pouco tempo, o país tinha uma nova constituição, o primeiro passo rumo ao “bolivarianismo”. Ao mesmo tempo, preços internacionais favoráveis para o petróleo possibilitaram ao governo multiplicar os gastos sociais, melhorando a vida das camadas mais pobres e, ao mesmo tempo, consolidando seu apoio. Ao mesmo tempo, as enormes receitas de exportação de petróleo lhe permitiram praticamente zerar o preço do combustível no mercado interno, aumentando ainda mais sua popularidade. O chavismo que se iniciava agradava a muita gente. Mas também incomodava, produção de alimentos em plena derrocada...
A colorida Laguna Cumaraguas, na península de Paraguaná, ponto mais ao norte da Venezuela
Enfim, assunto para um próximo post. O fato é que, apesar dos inúmeros problemas derivados do tal socialismo do século XXI, encher o tanque com apenas 15 centavos nos faz bem felizes. E foi com o tanque cheio que seguimos para o litoral, para a cidade de Adicora. Antes de descermos por lá, seguimos mais ao norte, para lagoas famosas por suas cores e pelas cores dos pássaros que neles vivem. A alimentação rica em camarões pinta as penas dos flamingos e colhereiros de vermelho. É nessa hora que sentimos mais falta de um bom zoom na nossa máquina fotográfica, mas, enfim, “fazemos o que podemos”!
A colorida Laguna Cumaraguas, na península de Paraguaná, ponto mais ao norte da Venezuela
Além dos pássaros, também a água ganha cores, dependendo do ângulo de incidência da luz do sol. Um espetáculo, quase um arco-íris avermelhado nas águas salgadas da lagoa que também é uma salina.
Chegando à Adícora, cidade no litoral da península de Paraguaná, ponto mais ao norte da Venezuela
Agora sim, de volta à Adicora, a praia onde o vento nunca para. Para aqueles que sabem ler o vento, difícil imaginar lugar melhor. A cidade está em uma pequena península e, embora o vento esteja dos dois lados, as ondas ficam apenas do lado sul. Nesse lado ficam os praticantes de kite surf, enquanto os amantes do Wind surf preferem as águas mais calmas da parte norte.
O farol de Adícora, no litoral da península de Paraguaná, ponto mais ao norte da Venezuela
Depois de passearmos um pouco pelas areias e admirar os esportes náuticos e a arquitetura da pequena vila, acabamos tomando a decisão de continuar a viagem. A ideia original era dormir por ali mesmo, mas resolvemos voltar para Coro e seguir para o sul, para a Serra de San Luis, região que exploraremos amanhã. Do mar para a montanha, do calor para o frescor, ainda conseguimos chegar a tempo de observar o pôr-do-sol lá de cima, numa paisagem e ambiente completamente diversos daqueles onde tínhamos passado todo o dia de hoje. E olha que são apenas 100 quilômetros entre um lugar e outro, dois mundos completamente diferentes.
As casas coloridas da cidade de Adícora, no litoral da península de Paraguaná, ponto mais ao norte da Venezuela
Há apenas três dias no país e já andamos por metrópoles e cidades históricas, o maior lago do continente e um autêntico deserto, uma praia onde o vento nunca para e montanhas úmidas onde cresce vegetação tropical e precisamos de casacos. A viagem na Venezuela, onde encher o tanque do carro não custa nada, está mais intensa do que nunca!
O belíssimo entardecer na Sierra de San Luis, ao sul de Coro, no noroeste da Venezuela
Um Greenland Husky, animal mais popular em Ilulissat, na Groelândia
Hoje foi o dia de quebrarmos todos os nossos recordes de latitude nessa viagem. Afinal, estávamos indo para Ilulissat, uma cidade que fica ao norte do Círculo Polar Ártico. Os continentes do hemisfério norte estão muito mais ao norte que os continentes do hemisfério sul estão ao sul. Confuso? Nem tanto, basta comparar as respectivas latitudes. Ushuaia, por exemplo, a cidade mais ao sul do planeta, tem uma latitude apenas um pouco maior do que Londres e já bem menor do que Glasgow, na Escócia. O correspondente sulino da latitude de Ilulissat seria em plena Península Antártica! Então, mesmo se realizarmos nosso sonho de, no final da viagem, pegar um barco para a Antártida, não chegaremos a uma latitude tão grande como a que chegamos hoje.
A magnífica paisagem gelada que se pode admirar no voo entre Nuuk e Ilulissat, na Groelândia
O que mantém essas latitudes tão altas na Europa e na Groelândia habitáveis é a famosa Corrente do Golfo, que traz as águas quentes do Caribe em direção a esta região. Por isso se diz que, caso o aquecimento global “desligue” a Corrente do Golfo, a consequência seria o resfriamento do norte da Europa, o que parece um paradoxo, um aquecimento causando um resfriamento. Bom, enquanto isso não acontece, hoje foi o dia de chegarmos à Ilulissat, a pequena cidade que fica ao lado da maior geleira do mundo fora da Antártida, a titânica Jakobshavn.
A magnífica paisagem gelada que se pode admirar no voo entre Nuuk e Ilulissat, na Groelândia
A viagem é feita num pequeno avião para uns 30 passageiros. Assim é feito o transporte entre as cidades do país, já que não há estradas na Groelândia. A companhia aérea local liga todas as cidades da costa oeste. As cidades da costa leste estão isoladas do resto do país e só são alcançadas via Islândia. A vista que se tem durante o voo, se São Pedro permitir, já paga o alto preço da passagem! Lá de cima, podemos observar as gigantescas geleiras, o mar de neve e gelo que cobre todo o interior do país e os milhares de icebergs que dominam os mares da ilha. A sensação é de se estar no meio de um documentário do National Geographic ou da Discovery.
Vista aérea de Ilulissat, cidade ao norte do Círculo Polar Ártico, na Groelândia
Ilulissat fica na Disco Bay, uma das mais belas regiões da Groelândia. Seu nome quer dizer exatamente “icebergs”, pela grande quantidade dessas montanhas de gelo que existem na Disco Bay. Afinal, aí está a desembocadura da enorme geleira Jakobshavn, responsável por quase 10% do fluxo de gelo que corre da ilha para o mar. São 100 milhões de toneladas diárias de gelo jogados no oceano, o bastante para abastecer a cidade de Nova Iorque 100 dias!
A cidade de Ilulissat, na Groelândia
A cidade de 5 mil habitantes, a terceira maior da Groelândia, é muito mais bonita que Nuuk. Não é a toa que se transformou no maior centro turístico da ilha. Mas agora, nesse final de temporada de inverno e antes do início do verão, éramos uns dos poucos visitantes ali.
Observando a paisagem gelada de Ilulissat, na Groelândia, de dentro do conforto do hotel
Nosso hotel enviou um carro para nos buscar no aeroporto e quando nos instalamos, deu para perceber que teremos três noites em alto estilo. A vista é absolutamente magnífica, aquele gelo todo à nossa frente, icebergs passando para lá e para cá. No pátio do hotel, entre os quartos e o mar, para completar o cenário ártico, lá estava uma matilha de Huskies Groelandeses, o animal mais importante do país. Ficam a céu aberto o dia inteiro, ignorando as temperaturas negativas, prontos para nos levar em corrida desvairada pelo gelo. Umas figuras simpaticíssimas!
Gelo cobre pequena baía em Ilulissat, na Groelândia
A gente se instalou e foi dar uma caminhada pela cidade. A temperatura pouco abaixo de zero não impedia que crianças jogassem futebol num campo semi-congelado. O ar gelado e as montanhas cobertas de gelo que nos cercavam eram um convite para entrarmos nos cafés quentinhos e aconchegantes que se espalham pelo pequeno centro.
Jogo de futebol no gelo, em Ilulissat, na Groelândia
Caminhando em Ilulissat, na Groelândia
Mas a gente deixou os cafés para o dia seguinte, pois tínhamos um jantar de boas vindas no hotel nos aguardando. Uma entrada e um prato principal deliciosos, acompanhados de vinho e daquela vista fenomenal na janela à nossa frente. Eis um lado do nosso continente completamente diferente do que já vimos até agora!
Acompanhado de bom vinho, nosso jantar de boas vindas à Ilulissat, na Groelândia
Uma das razões para virmos para a Groelandia ainda no final da temporada de inverno foi a expectativa de ver a aurora boreal, ou Northern Lights. Mas nossa primeira noite por aqui já nos tirou qualquer esperança. Simplesmente, não fica escuro! O sol se põe às 10:30 da “tarde”. E já nasce novamente um pouco depois das duas da manhã. Nesse intervalo, mal é preciso ligar os postes de iluminação. A noite fica bem mais clara que uma noite de lua cheia nos trópicos. A esperança da aurora boreal fica para o sul da Islândia, onde deve ficar um pouco mais escuro do que aqui.
Balcão do nosso hotel em Ilulissat, na Groelândia
Socializando com um filhote de Greenland Husky, em Ilulissat, na Groelândia
Amanhã a programação é um passeio de helicóptero até o alto da geleira gigante. Mas o voo só sai com bom tempo e um número mínimo de turistas. Infelizmente, acho que não vai ser o caso. Mas não faltarão lugares para explorar nas redondezas. O que vai faltar, talvez, são casacos para isso, hehehe!
Um belo fim de tarde, às 10:30 da noite! (em Ilulissat, na Groelândia)
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