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Karina (27/09)
Olá, também estou buscando o contato do barqueiro Tatu para uma viagem ...
ozcarfranco (30/08)
hola estimado, muy lindas fotos de sus recuerdos de viaje. yo como muchos...
Flávia (14/07)
Você conseguiu entrar na Guiana? Onde continua essa história?...
Martha Aulete (27/06)
Precisamos disso: belezas! Cultura genuína é de que se precisa. Não d...
Caio Monticelli (11/06)
Ótimo texto! Nos permite uma visão um pouco mais panorâmica a respeito...
Apontando o fim do Chile e da América, região de Punta Arenas
Qual é o ponto mais ao sul da América do Sul? Até onde se pode chegar de carro? As respostas para essas perguntas dependem de uma definição fundamental: ilhas valem? Por exemplo, todos sabemos que o ponto mais oriental do Brasil (e das Américas!) é a Ponta Seixas, na Paraíba. Nós até passamos lá nessa viagem e celebramos a marca. Mas, e Fernando de Noronha? Está muito mais a leste que Ponta Seixas, não está? E não faz parte do Brasil e da América do Sul? E, nesse caso, se ilhas “valerem”, então o ponto mais a leste das Américas é a costa oriental da Groelândia!
O mar e o céu do extremo sul do Chile e da América, região de Punta Arenas
A caminho do extremo sul da América do Sul, na região de Punta Arenas, sul do Chile
Alguém poderá argumentar: “mas elas não fazem parte da plataforma continental!”. Sei... Ilhas são ilhas. Podem fazer parte do continente em um sentido mais amplo, mas as verdadeiras terras continentais terminam onde o mar começa. Um continente nada mais é do que uma ilha bem grande. Se alguém quiser dar uma volta nessa ilha chamada América, vai passar com seu barco pelo Estreito de Magalhães. Ao norte, a América, ao sul, a Terra do Fogo, a maior ilha “ao largo” da América do Sul.
Praia na região de Fuerte Bulnes, ao sul de Punta Arenas, no extremo sul do Chile e da América
Barcos pesqueiros em baía próxima ao Fuerte Bulnes, ao sul de Punta Arenas, no extremo sul do Chile e da América
Tudo isso para dizer que hoje nós tentamos chegar o mais perto possível do fim da América do Sul. O extremo sul do continente, da mesma maneira que chegamos à Ponta Seixas (extremo leste) e à Punta Gallinas (extremo norte, na Colômbia), ou quando nos aproximamos de Prudhoe Bay, no Alaska. Depois, porque nós não temos nada contra as ilhas, também vamos à Terra do Fogo e à famosa Ushuaia, ainda mais ao sul do que onde estivemos hoje. Mas aí, já não serão “terras continentais puras”, pelo menos até a próxima era glacial!
Entrada do Fuerte Bulnes, ao sul de Punta Arenas, no extremo sul do Chile e da América. Nós não entramos, pois achamos muito caro
Ainda ontem, viajamos de Puerto Natales para Punta Arenas, a maior metrópole dessa parte do mundo. Vou falar da cidade e da belíssima tarde que passamos por lá no próximo post. Esse é mesmo sobre a nossa busca do extremo sul da América, algo que já atiçava nossa curiosidade há algum tempo. Quando ontem descobrimos que o asfalto continuava ao sul de Punta Arenas, já decidimos: “É para lá que vamos amanhã!”. Pois é, hoje cedinho já era “amanhã” e nós partimos em busca do fim da estrada. O mapa indicava o local até onde seguia esse asfalto: Fuerte Bulnes. Já tínhamos um primeiro destino no dia.
Visita ao local do antigo povoado de Rey Felipe, 60 kms ao sul de Punta Arenas, no extremo sul do Chile
Monumento em honra aos antigos colonizadores de Puerto Hambre, 60 kms ao sul de Punta Arenas, no extremo sul do Chile
São quase 60 kms até lá, de estrada boa e praticamente deserta. Chegamos a uma baía com o tétrico nome de Puerto Hambre (ou “porto da fome”). Está a dois quilômetros ao norte de Fuerte Bulnes e toda a região respira história. Em Puerto Hambre há ruínas de um pequeno povoamento com 430 anos de idade, a trágica Rey Don Felipe. A história é mais ou menos o seguinte: em 1520, Fernão de Magalhães foi o primeiro europeu a navegar por essas águas e descobrir o estreito que leva o seu nome e une o Oceano Atlântico ao Pacífico. Essa importante rota de navegação virou segredo de estado para os espanhóis que então começavam a explorar a costa ocidental do continente americano. Foi apenas pouco mais de meio século mais tarde, em 1578, que um navegador de outro país, o inglês Francis Drake, conseguiu repetir a rota, abrindo esse novo oceano para aventureiros de outras nacionalidades. Corsário, pirata ou herói, dependendo do ponto de vista, mas sem nenhuma dúvida um dos melhores navegantes de todos os tempos, Drake aproveitou a oportunidade para pilhar e destruir vários portos espanhóis, então completamente desprotegidos, na costa do Pacífico. Esse evento fez acender a luz amarela em Madrid.
O cemitério inglês em Puerto Hambre, 60 kms ao sul de Punta Arenas, no extremo sul do Chile
Placa informativa sobre o capitão ingês Pringle Stokes que se suicidou em Puerto Hambre, 60 kms ao sul de Punta Arenas, no extremo sul do Chile, em 1828
Os espanhóis decidiram ocupar alguma enseada ao longo do Estreito de Magalhães e assim, proteger militarmente essa passagem tão estratégica. E foi assim que, em 1584, foram deixados ali 300 colonizadores para fundar o povoamento de Rey Don Felipe. Mas as condições climáticas terríveis e o pouco conhecimento desses europeus mediterrâneos sobre a vegetação e solo locais resultaram em tragédia. A fome e o frio mataram todos eles. Três anos mais tarde, quando o próximo navegador passou por ali, o inglês Thomas Cavendish, ele só encontrou ruínas e cadáveres esqueléticos. Prontamente, o “promissor” povoado foi rebatizado para “Port Famine” que traduzido ao espanhol, virou Puerto Hambre. Ruínas e túmulos desse malfadado empreendimento ainda estão ali para serem observados, mais de quatro séculos mais tarde.
Estrada rústica na praia 70 km ao sul de Punta Arenas, no extremo sul do Chile e da América
Um riacho e uma cascata no extremo sul do Chile e da América, região de Punta Arenas
Diante desse insucesso, os homens resolveram deixar esse trecho do continente apenas para os olhos curiosos dos eventuais navegadores que ali passavam pelos próximos dois séculos e meio. Foi só no início do séc. XIX que a marinha da Inglaterra passou a usar a área para seus navios. Aí foi a base de exploração do navio Beagle (aquele em que viajava o jovem Charles Darwin) durante muito tempo. Mas aparentemente os fantasmas de Port Famine continuavam em atividade. O capitão do navio, Pringle Stokes, entrou em depressão severa e se matou com um tiro na cabeça. Ele está enterrado em um pequeno cemitério inglês da região. Foi sua morte que abriu o espaço no comando do Beagle para outro inglês, Fitz Roy, aquele que foi homenageado por Perito Moreno ao batizar com seu nome a montanha mais bela do mundo, no Parque Nacional Los Glaciares.
Aproximando-se do extremo sul do Chile e da América, região de Punta Arenas
O último farol e o extremo sul do Chile e da América, região de Punta Arenas
Alguns anos mais tarde, em 1843, foi a vez do Chile, agora uma nação soberana, resolver ocupar militarmente a área para reforçar suas pretensões territoriais sobre o extremo sul do continente. Foi quando construíram o Fuerte Bulnes, um pouco ao sul de Puerto Hambre. Mas mesmo em pleno séc. XIX, as condições naturais se mostraram demasiadamente severas para os novos colonizadores. Em 1848, o governo chileno fundou Punta Arenas, 60 kms ao norte e em um local muito mais aprazível. Fuerte Bulnes foi abandonado. Um século mais tarde, agora como curiosidade histórica, o forte foi reconstruído e transformado em atração turística. Infelizmente, cara demais para nós. Quando descobrimos o preço de 25 dólares por pessoa para poder ver alguns casebres de madeira e canhões enferrujados, decidimos não entrar. A visita à praia e às ruínas de Rey Felipe já havia saciado nossa curiosidade histórica. Agora, voltávamos novamente o foco à curiosidade geográfica mesmo. Até onde seguiria a estrada?
Um "morador" do extremo sul do Chile e da América, ao sul de Punta Arenas
Patos voam para o norte vindos da ponta sul do Chile e do continente, região de Punta Arenas
Encontrando uma pata de crustáceo gigante durante caminhada no extremo sul do Chile e da América, região de Punta Arenas
Logo depois do Fuerte Bulnes, o asfalto acaba. O asfalto, mas não a estrada, que segue adiante, agora de rípio. Desde a saída para o Bulnes, são mais quinze quilômetros, agora até o fim do rípio. Fim da estrada? Não, apenas do rípio. Dessa vez, a rota continua sobre a praia de pedras mesmo. É possível ver a marca dos pneus e a gente segue em frente!
Fim de estrada para a Fiona no caminho para o extremo sul do Chile e da América, região de Punta Arenas
Fim de estrada para a Fiona no caminho para o extremo sul do Chile e da América, região de Punta Arenas
Felizes e destemidos, seguimos adiante. Com o devido cuidado, passamos por alguns riachos pequenos que chegam até a praia. Tudo está ficando mais estreito, a praia, o caminho. Não à toa, afinal, este é o estreito de Magalhães.
A caminho do extremo sul da América do Sul, na região de Punta Arenas, sul do Chile
1000dias no extremo sul do Chile e da América, região de Punta Arenas
Bem lentamente, acho que avançamos mais uns quatro quilômetros. Agora sim, é o fim do caminho para a Fiona. Muitas pedras grandes e rochedos na praia. Nossa companheira não pode seguir mais, mas nós sim. Deixamos ela estacionada ali, tão perto do fim do mundo, e seguimos caminhando.
Litoral no extremo sul do Chile e da América, região de Punta Arenas
Com o fim da estrada, seguimos caminhando pela praia rumo no extremo sul do Chile e da América, região de Punta Arenas
Com o fim da estrada, seguimos caminhando pela praia rumo no extremo sul do Chile e da América, região de Punta Arenas
Apenas um solitário cavalo e alguns patos que passam voando são testemunhas do nosso esforço naquela praia tão isolada. A água é transparente e calma. Tem ares de lago. Mas é o mar, o finzinho do Atlântico. Uns poucos quilômetros a mais e já seria o Pacífico. Nunca, nesses mais de três anos de viagem, estivemos tão próximos do encontro desses oceanos gigantes. Que interessante seria poder voltar no tempo quase meio milênio e observar dali, tão de perto, a passagem de Fernão de Magalhães.
As águas claras e geladas do mar no extremo sul do Chile e da América, região de Punta Arenas
Extremo sul do Chile e da América, farol de San Isidro ao fundo, região de Punta Arenas
Mas não foi ele ou seu barco que apareceram na próxima curva. Foi o Farol de San Isidro, o último do continente. A partir daí, a costa faz uma curva em direção a oeste. Quase já não avança mais ao sul. Mas aquele ponto mágico, o mais ao sul, está mesmo naquela direção. É chamado de Cabo Froward e há uma cruz de madeira para marcá-lo. Para chegar até lá, seriam dois dias de caminhada por território completamente isolado. São pouquíssimas as pessoas que fazem essa trilha, mas parece ser um caminho lindo. O mais comum é que pessoas cheguem lá de barco, em excursões organizadas em Punta Arenas.
Extremo sul do Chile e da América, farol de San Isidro ao fundo, região de Punta Arenas
San isidro, o último farol do continente, região de Punta Arenas, sul do Chile
Mas para nós, San Isidro é o suficiente. Nossa curiosidade geográfica está satisfeita. Do outro lado do canal, vemos bastante terra. É a Terra do Fogo. Daqui, claramente se percebe que ela avança muito mais para o sul. É para lá que seguiremos amanhã. Para quem acompanha nossa viagem, sabe que já passamos por Ushuaia. Mas estávamos sem a Fiona, então temos de voltar lá. Esse “temos” é com muito prazer, claro!
A maior latitude sul da Fiona no continente americano, região de Punta Arenas, sul do Chile
Quase na pontinha sul da América do Sul, região de Punta Arenas, sul do Chile
A Fiona chega ao sul da América do Sul, região de Punta Arenas, sul do Chile
Lanchamos ali, olhando para a geografia e história diante dos nossos olhos. Depois, hora de voltar para a Fiona. Seu GPS nos traduziu ainda melhor aonde tínhamos chegado. Não só o número da latitude sul, 53 graus e 44,873 minutos, mas também a representação geográfica disso, uma visão do satélite lá de cima. Foi um momento de emoção, pois não muito tempo atrás, vimos um mapa parecido, mas oposto. Estávamos no norte do norte do Alaska, a Rússia ali do lado. Do extremo norte ao extremo sul do continente, por terra, em quatro rodas. É... essa ilha chamada América não é tão grande assim. Pelo menos, não tão grande quanto nossos sonhos.
Quase no extremo sul do Chile e da América, região de Punta Arenas
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