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Karina (27/09)
Olá, também estou buscando o contato do barqueiro Tatu para uma viagem ...
ozcarfranco (30/08)
hola estimado, muy lindas fotos de sus recuerdos de viaje. yo como muchos...
Flávia (14/07)
Você conseguiu entrar na Guiana? Onde continua essa história?...
Martha Aulete (27/06)
Precisamos disso: belezas! Cultura genuína é de que se precisa. Não d...
Caio Monticelli (11/06)
Ótimo texto! Nos permite uma visão um pouco mais panorâmica a respeito...
A luz de fim de tarde ilumina a face noroeste do Aconcágua entre nuvens, visto a partir dos 5 mil metros de altitude do Pico do Bonete, em frente à montanha, na região de Mendoza, oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
Nós não subimos o Aconcágua durante os 1000dias. Esse post conta a história de minha outra viagem para cá, no final de 1998, início de 1999. Como não tivemos tempo de tentar subir a montanha dessa vez, achei interessante contar como foi chegar ao ponto mais alto das Américas, mesmo que tendo sido em outra viagem. A história virá em duas partes, com fotos da época. Meu companheiro daquela vez foi o Haroldo, um primo que também esteve conosco em diversas oportunidades durante os 1000dias. A última, quando subimos o vulcão Villarrica, conforme relatado nesse post
O ano de 1998, para mim, foi de altos e baixos. Ou, para ser mais exato, de baixos e altos. Cronologicamente, foi assim que funcionou, em sentido figurado e no literal também. Comecei o ano perdendo o emprego e o chão. Terminei o ano no meio de uma fantástica viagem que me levou pelos quatro cantos do mundo. Entre tantos lugares visitados, fui do ponto mais baixo da Terra, o Mar Morto, a 427 metros abaixo do nível do mar, ao ponto mais alto das Américas, o cume do Aconcágua, a 6.962 metros de altitude. Como disse, baixos e altos...
Mapa 3D da região do Aconcágua, na Argentina. Aí percebe´se claramente que a trilha se divide em Confluencia, à direita seguindo para Plaza Francia (nosso caminho de agora) e à esquerda para Plaza de Mulas (caminho que fiz em 1999)
Mapa de trilhas e altitudes da região do Aconcágua, a maior montanha das Américas, nos Andes argentinos. Nós caminhamos de Horcones até Confluencia no 1o dia. No 2o dia, fomos até Plaza Francia, em frente à Parede Sul e retornamos à Confluencia. No 3o dia
A crise econômica mundial causada pelo colapso da moeda da Tailândia, no final de 97, atingiu o Brasil com violência. Muitas empresas financeiras quebraram, inclusive aquela em que eu havia trabalhado por 3 anos. Fiquei sem emprego, mas com boas economias guardadas. Por algum tempo, fiquei na grande dúvida entre aplicar esse dinheiro em um MBA no exterior (cheguei a fazer provas e quase enviei as applications) ou dar uma bela de uma volta ao mundo. O sangue português dos grandes descobrimentos falou mais alto e optei pela segunda opção. Europa, Oceania, Ásia e norte da África, tudo isso em oito meses. O natal de 98 foi passado em Belém, cidade onde nasceu e cresceu Jesus, em Israel. No auge da détente entre israelenses e palestinos, Yasser Arafat passou a poucos metros de mim e outro bando de turistas. Poucos dias antes, eu havia visitado e nadado no Mar Morto, um antigo sonho de criança. Agora, meu objetivo era outro, quase inverso. Já há alguns meses, vinha combinando com um primo de nos encontrarmos na Argentina para subir o Aconcágua, a montanha que havíamos visto tão rapidamente sete anos antes, quando viajamos por Argentina e Chile. Daquela vez, só o vimos da janela do ônibus que nos levava de Mendoza a Santiago. Mas foi o bastante para nos prometermos voltar algum dia. Esse dia havia chegado!
Preenchendo papéis e registros na entrada do Parque Provincial Aconcágua, região de Mendoza, oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
Com o Haroldo, entrando no Parque Provincial Aconcágua, região de Mendoza, oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
O Haroldo, meu primo, já havia passado seu mês de férias viajando comigo na Nova Zelândia. Foi em Abril de 98. Agora, oito meses mais tarde, em 28 de Dezembro, a gente se reencontrava no aeroporto de Buenos Aires. Ele trazia cerca de 60 kg de bagagem do Brasil. Não só suas roupas e equipamentos para subir o Aconcágua, mas também boa parte dos meus. Afinal, eu não andava pelo mundo carregando esse peso todo. Ele também trazia uma parte da comida que levaríamos à montanha, aquela mais rica em energia, como frutas secas, chocolates e leite em pó. O resto, como macarrão e sopa, compramos juntos em Mendoza, para onde voamos, já reunidos, no mesmo dia. Foi em Mendoza também que alugamos nossas botas duplas e grampões, essenciais para enfrentar o frio e o gelo nas altas altitudes. Barraca e sacos de dormir também haviam sido trazidos pelo Haroldo. Por fim, em Mendoza pagamos pelo “permiso” para subir a montanha (na época, uns 70 dólares. Hoje, o preço é quase dez vezes maior!), compramos nossas passagens de ônibus para Puente del Inca (onde começava a caminhada) e contratamos mulas para levar boa parte do peso da nossa bagagem até Plaza de Mulas, o campo base para se subir o Aconcágua pela rota normal.
Perfil da caminhada até Plaza de Mulas, campo base para a rota normal de ascenso do Aconcágua, nos Andes argentinos, região de Mendoza
Nós iríamos tentar o Aconcágua sem guias ou expedição organizada. Naquela época, isso era mais comum, embora já houvesse muitas expedições comerciais também. Nos últimos quinze anos, agências que oferecem esse serviço se multiplicaram e eu diria que hoje, a maioria das pessoas que tenta o Aconcágua está nesses grupos. Outra coisa que mudou foram os preços e as regras, tudo bem mais controlado. O aumento de preço veio para controlar a quantidade de acessos que aumentava sem parar. Tudo bastante concentrado nos meses entre Dezembro e Fevereiro, quando as condições climáticas na região são mais amenas. Naqule ano, foram cerca de 4 mil pessoas. Esse número chegou a dobrar até 2010, mas o aumento de preços funcionou. Agora, na temporada 2013/14, foram pouco mais de 5 mil pessoas. O “permiso” é mais caro para quem vai sem grupo organizado, um estímulo para que se siga com agências e guias. A razão disso é a segurança, guias experientes sabem cuidar melhor de nós do que nós próprios, especialmente em uma região onde o tempo muda tão rapidamente e que eles conhecem muito melhor do que nós. Além disso, agora, em cada acampamento, precisamos nos registrar e fazer exames médicos. Pessoas continuam a morrer no Aconcágua, mas tenho certeza que seria muito pior sem essas novas regulações.
Cruzando o rio Horcones a caminho de Confluencia, o primeiro acampamento na trilha normal do Aconcágua, no oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
Com o Haroldo, prontos para iniciar a caminhada rumo a Confluencia e Plaza de Mulas, no parque do Aconcágua, oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
Bom, seja pela aventura, pelo preço ou pela liberdade, eu e o Haroldo, naquela época, preferimos ir sozinhos. Lemos tudo o que pudemos sobre a montanha, conversamos com pessoas que já haviam estado lá e montamos nosso plano de ataque. Como estávamos sós, tínhamos a liberdade de mudar esses planos conforme íamos subindo a montanha e nos aclimatando, de acordo com nosso cansaço, adaptação à altitude, estado de ânimo e condições meteorológicas na montanha. De maneira geral, tudo isso concorreu para que acelerássemos nossos planos iniciais. Nossa adaptação foi mais rápida do que havíamos imaginado e não queríamos perder as chances de bom tempo que o Aconcágua estava nos fornecendo.
Primeiro dia de caminhada, quase chegando em Confluencia, no parque Provincial Aconcágua, região de Mendoza, oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
Nós havíamos feito todas as compras e burocracias na tarde do dia 28, em Mendoza. No dia 29, bem cedo, embarcamos para Puente del Inca, onde chegamos perto do meio dia. Aí encontramos nossa mula que seguiria, numa grande tropa, diretamente para Plaza de Mulas. Fizemos a divisão de bagagens e ficamos apenas com a barraca, sacos de dormir, um pouco de roupa e comida. O grosso seguiu com ela. Despachada a mula, caminhamos uns quatro quilômetros até a entrada do parque e outros dois até o posto de guarda-parques. Já estávamos ganhando altitude! Dos 2.800 metros de Puente del Inca até quase os 3 mil do posto de entrada da trilha, onde fizemos nossas últimas burocracias. Dia de céu azul, a tarde apenas começando, estávamos ansiosos para, finalmente botar o pé na trilha de verdade. E assim foi, viemos caminhando tranquilamente pelo vale do rio Horcones, esse mesmo trecho que eu e a Ana fizemos agora em 2014, até Confluencia. A diferença é que Confluencia era um pouco mais adiante, depois que as trilhas para Plaza Francia e Plaza de Mulas de dividem, logo após cruzarmos o rio Horcones novamente, agora para a margem esquerda de quem está subindo. A trilha havia sido tranquila e nós, agora, já estávamos acima dos 3.400 metros de altitude. Armamos nossa barraca, lanchamos e combatemos a dor de cabeça que se iniciava com dois excedrins cada um. Na época, não tínhamos neosaldina!
Acampado em Confluencia, a caminho de Plaza de Mulas e do Aconcágua, na região de Mendoza, oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
Acampamento de Confluencia, a caminho de Plaza de Mulas e do Aconcágua, na região de Mendoza, oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
No dia seguinte, véspera de réveillon, seguimos em frente. Muita gente, já naqueles dias, preferia passar duas noites em Confluencia para ajudar no processo de aclimatação. Aproveitavam para fazer um bate-volta e ir conhecer Plaza Francia. Foi o que não fizemos e só agora, 15 anos mais tarde, é que tive a chance de chegar perto da majestosa face sul do Aconcágua e sua temida parede de mais de dois quilômetros de altura. Nós estávamos era com pressa de chegar em Plaza de Mulas e ver de perto o que nos esperava, a rota normal em direção a Nido de Condores, Berlin e o cume do Aconcágua. Esse segundo dia de caminhada é mais longo que o primeiro e mais chato também. Atravessamos a chamada “Playa Ancha”, um interminável vale formado pelo leito quase seco do rio Horcones, chão formado por pedras e mais pedras que requerem concentração par não cair. Além disso, temos de cruzar riachos o tempo todo. Vamos ganhando altura bem lentamente até que damos de cara com a “Encosta Brava”. O nome já dá uma pista do que se trata. Uma pirambeira que vamos vencendo com muita determinação e ziguezagues. Lá no alto, já estamos a 4.300 metros de altitude. De um lado, ao pé da montanha, o acampamento de Plaza de Mulas, já com algumas dezenas de barracas. Do outro, uns 25 minutos de caminhada, o Hotel Refugio, mais refúgio do que hotel, mas considerado o hotel mais alto do mundo. Para ele seguimos, pois nossa ideia era armar nossa barraca ali do lado.
Acampado ao lado do refúgio em Plaza de Mulas, 4.300 metros de altitude, aos pés do Aconcágua, no oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
O refúgio em Plaza de Mulas, o hotel mais alto do mundo, aos pés do Aconcágua, oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
Estar perto do hotel fazia parte da nossa estratégia para conquistar a montanha. A melhor maneira de adaptar nosso organismo às grandes altitudes é fazer a tática do sobe-desce. Subimos cada vez mais altos para nosso corpo tomar contato com o ar rarefeito e descemos em seguida para descansar em lugares mais baixos. Com isso o organismo começa a se adaptar biologicamente, por exemplo, começando a produzir mais glóbulos vermelhos para carregar com mais eficiência o oxigênio cada vez mais escasso. Em algum momento da nossa programação, devemos subir até um ponto mais alto, armar nossa barraca por lá e descer para ganhar energias para o ataque final. Depois, subimos novamente, agora com muito menos peso, pois a barraca já está no alto. Dormimos uma noite por lá e atacamos o cume. Estratégia perfeita, mas requer duas barracas, pelo menos para os dias em que a barraca estiver armada no alto e nós estivermos mais abaixo. Duas barracas ou uma barraca e um hotel! Bingo! Para quem vai de expedição paga, essa logística não é preocupação. Jamais vai ter de carregar barraca e sempre haverá alguma lhe esperando quando chegar em qualquer acampamento. Para quem vai sozinho como nós, ou carrega a barraca o tempo todo, ou leva duas barracas, ou conta com um hotel. Foi a nossa opção! Então, ainda em Mendoza, já compramos 3 noites de hotel e várias refeições. Por isso, além de ter de carregar menos comida aqui para cima, como éramos clientes deles, poderíamos usar o tempo todo suas instalações. Isso incluía a cozinha coletiva, as mesas do restaurante e o delicioso salão aquecido com um fogareiro. Foi aí que jogamos incontáveis partidas de crapô, um jogo de cartas, para passar o tempo. Também nos divertíamos na mesa de ping-pong, conhecíamos outras pessoas e, se pagássemos 10 dólares, tínhamos até direito a um rápido banho quente. Pequenos confortos como esses nos recompõe a energia e ajudam muito no desafio de subir a montanha.
Rumo ao Pico do Bonete, atravessando os gelos penitentes, nossa primeira caminhada de aclimatação na regiaõ de Plaza de Mulas, aos pés do Aconcágua, oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
Rumo ao Pico do Bonete, atravessando os gelos penitentes, nossa primeira caminhada de aclimatação na regiaõ de Plaza de Mulas, aos pés do Aconcágua, oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
Agora em 2014, descobrimos que esse hotel-refúgio foi desativado há alguns anos. Uma pena, pois a energia lá era muito boa, um pouco de conforto a 4.300 metros de altitude. Não tem preço! Em compensação, grandes agências montam seus próprios pequenos hotéis, sob lona, tanto em Plaza de Mulas como em Confluencia. Com chuveiro, cozinha e restaurante. Mas duvido que seja como era o hotel-refúgio. Espero, sinceramente, que ele seja reaberto nos próximos anos. Aparentemente, foi até dilapidado pelo último concessionário e a falta de manutenção vem mostrando seus efeitos. Mas a estrutura ainda está lá e um pequeno investimento o recuperaria. Ainda bem que não o vi nesse estado e minhas memórias são daquela doce temporada de 98/99.
Um pouco acima dos 5 mil metros, no cume do Pico do Bonete, na nossa primeira caminhada de aclimatação na região de Plaza de Mulas, parque do Aconcágua, oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
Pois então, chegamos até ele, armamos nossa barraca e começamos a usufruir da mordomia, principalmente do calor acolhedor do fogareiro. A noite foi fria na barraca, mas tínhamos roupas o suficiente, nossa bagagem trazida pela mula já nos esperava por lá. Nem precisei tomar excedrin para dormir, mas o Haroldo tomou os seus. Na manhã do dia 31, acordamos bem e queríamos dar prosseguimento ao nosso processo de aclimatização. Para isso, precisávamos caminhar. A escolha óbvia, o que quase todos ali fazem, era subir em direção a Nido de Condores, o próximo acampamento no caminho até o cume. Nós conseguíamos ver a trilha de longe subindo a encosta do Aconcágua. Era amedrontadora, não por ser perigosa, mas pelo tamanho inacabável da tal encosta. Um infinito ziguezague segue encosta acima, as pessoas quase sumindo na distância, apenas pequenos pontinhos que mais pareciam formigas se movendo em câmara lenta. Saber que teríamos de subir aquela encosta várias vezes nos dava preguiça só de pensar. Saímos dos 4.350 metros de Plaza de Mulas para subir até os 5.550 metros de Nido. Tudo isso em um só ziguezague. É massacrante, só de ver.
Festa de reveillon no refúgio em Plaza de Mulas, o hotel mais alto do mundo, aos pés do Aconcágua, oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
Foi quando o Eduardo apareceu para nos salvar. Ele era a pessoas que estava tomando conta do hotel-refúgio naquela temporada e conhecia muito bem a região. Sugeriu que subíssemos outra montanha, para variar. O Pico do Bonete tem 5.100 metros de altura e fica atrás do refúgio e de frente para o Aconcágua. Pode-se caminhar até lá em cima, trilha razoavelmente bem marcada. Uma opção muito melhor que a encosta para Nido. Prontamente compramos a ideia e fomos para lá no início da tarde, com a ideia de voltar assim que ficássemos demasiado cansados ou que a dor de cabeça atrapalhasse. Mas, na verdade, não foi assim. Mal demos os primeiros passos e já resolvemos tomar nosso excedrin. Dor de cabeça, ninguém merece! Um pouco mais adiante, cruzamos com os gelos penitentes, uma das marcas registradas dessa região. São pequenas torres de gelo que parecem caminhar em uma procissão, em fila indiana. Daí o nome, “penitentes”. São uma pequena geleira e podemos caminhar entre eles. Esses que vimos não eram grandes, dois metros no máximo, mas em outros lugares eles podem ficar bem maiores. Mais uma hora de caminhada e chegamos ao pé da montanha. Depois, foi só subir, subir e subir. No fim da tarde, cheguei ao cume, feliz. De volta aos 5 mil metros, uma marca bem importante nesse nosso caminho para o topo do Aconcágua, quase dois quilômetros mais alto. O Haroldo chegou um pouco depois, quando o tempo já tinha fechado. Nossa primeira nevasca nas alturas. Bom para testar nossas roupas! Quando começamos a descer, o tempo voltou a abrir e o Aconcágua, grandioso e magnâmico, apareceu na nossa frente. Que lindo! Difícil acreditar que poderíamos chegar lá no alto daquele gigante!
Trilha, pontos de parada e altitudes no caminho entre Plaza de Mulas e o cume do Aconcágua, na Argentina. Nós atacamos o cume desde Nido de Condores
Um ótimo último dia do ano para nós, mas ele ainda não havia acabado e iria melhorar. O hotel organizou um grande churrasco-festa de réveillon e a gente se esbaldou! Que privilégio, passar a última noite do ano naquele lugar, naquela altitude e com aquela festa. Do lado de fora, céu estrelado e o Aconcágua a nos observar. Foi mágico! Nossa noite se esticou e resolvemos tirar o dia seguinte, o primeiro do ano de 1999, de folga. Estávamos merecendo. Tudo o que fizemos, além de jogar crapô e nos esquentar no fogareiro, foi caminhar os 25 minutos até o acampamento de Plaza de Mulas. Fomos vestindo (e estreando) nossas botas duplas alugadas em Mendoza. Nossa... que dificuldade! Nada como um calçado mais leve e ágil. Foi um bom exercício, mas imaginar ter de calçar aquilo e caminhar até o cume do Aconcágua foi desanimador. Tanto que, no dia seguinte, na primordial etapa do “porteio”, deixamos as botas duplas para trás e voltamos para as muito mais confortáveis botas simples.
Montanhas nevadas cercam Plaza de Mulas, acampamento aos pés do Aconcágua, no oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
De Plaza de Muilas, visão do vale do rio Horcones, no parque do Aconcágua, região de Mendoza, oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
Pois é, o dia 2 foi nosso dia de porteio. Carregamos nossa barraca, sacos de dormir, comida e fogareiro mais de 1.200 metros verticais para cima, até Nido de Condores. Vencer aquela encosta e os infinitos vai-e-vens da trilha foi um sufoco danado. Chegando em Cambio Pendiente, 250 metros abaixo de Nido de Condores, e justamente aonde a trilha deixa de ser tão inclinada, achei que não conseguiria dar mais nenhum passo. Era a altitude pesando no coração e no pulmão. Achei que já estava bem por não ter de tomar mais excedrin, mas estava enganado. Enfim, o Haroldo seguiu na frente e, quando finalmente cheguei lá, ele já estava montando nossa barraca. Estávamos um pouco adiantados na temporada, o maior número de pessoas só vem depois do réveillon. Assim, eram apenas outras dez barracas no acampamento. A ideia do Haroldo era montar a barraca e descer, mas eu queria passar a noite por lá, dar uma forçada no processo de aclimatação. Não chegávamos a um acordo, mas São Pedro estava do meu lado e enviou uma nevasca que convenceu o Haroldo a ficar. Tivemos uma noite duríssima, o excedrin nos salvando da dor de cabeça, mas nada ajudando contra a sensação de falta de ar que tínhamos durante o sono. Acordamos diversas vezes arfantes, mas tenho certeza que o esforço acelerou bastante as mudanças necessárias no nosso metabolismo.
Iniciando a caminhada rumo a Nido de Condores, acampamento avançado na encosta do Aconcágua, no oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
Acordamos dia 3 bem cansados. Minha ideia na noite anterior era acordar e caminhar até Berlin, quase aos 6 mil metros, um último exercício de aclimatação. Depois, voltaríamos diretamente para Plaza de Mulas, para o conforto do hotel-refúgio. Mas a noite mal dormida nos fez mudar de ideia. Nada de Berlin, desceríamos imediatamente. A cada passo para baixo, era como se mergulhássemos no oxigênio renovador. Um belo sanduíche de hamburguesa e o calor do fogareiro do hotel ajudaram mais ainda na nossa recuperação. O resto do dia foi devotado ao crapô e ao descanso. Aliás, o dias seguinte também. Duas noites com cama e colchão completaram nosso processo de recuperação de energias. No dia 6, cedinho, estávamos prontos para subir novamente. Mas, dessa vez, iríamos mais para o alto. O cume era o limite e nossa maior preocupação era que a barraca, com todo o nosso material dentro, tivesse resistido à noite de ventos muito fortes que tínhamos passado. Isso, só iríamos descobrir quando chegássemos lá em cima...
Pausa para descanso na subida entre Plaza de Mulas e Nido de Condores, acampamentos ao longo da trilha normal para o cume do Aconcágua, no oeste da Argentina (temporada de 1998/99)
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