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Karina (27/09)
Olá, também estou buscando o contato do barqueiro Tatu para uma viagem ...
ozcarfranco (30/08)
hola estimado, muy lindas fotos de sus recuerdos de viaje. yo como muchos...
Flávia (14/07)
Você conseguiu entrar na Guiana? Onde continua essa história?...
Martha Aulete (27/06)
Precisamos disso: belezas! Cultura genuína é de que se precisa. Não d...
Caio Monticelli (11/06)
Ótimo texto! Nos permite uma visão um pouco mais panorâmica a respeito...
O movimentado porto de Iquitos, na beira do rio Amazonas, no Peru (foto de Julho de 1990)
Várias vezes durante os 1000dias passamos pela região amazônica. Com a Fiona ou de barco, quase sempre no Brasil, mas também em outros países, já que esse incrível ecossistema se estende por uma vasta região da América do Sul, incluindo países como as Guianas, Venezuela, Colômbia, Equador, Bolívia e Peru. Neste último, passamos pela cidade de Puerto Maldonado quando percorríamos a rodovia interoceânica, a estrada que liga o Acre com Cusco, no Peru. Mas a nossa experiência amazônica peruana foi meio conturbada, já que a Ana adoeceu na cidade e ficamos mais entre hospitais e farmácias do que entre árvores e macacos (veja o post aqui). De qualquer maneira, a cidade-símbolo da Amazônia peruana não é Puerto Maldonado, mas Iquitos, mais ao norte, muito maior e mais isolada. Iquitos é a maior cidade do mundo onde não se pode chegar por estradas. Incrustrada no meio da selva e na orla do maior rio do planeta, com mais de 300 mil habitantes, ali só se chega de avião ou de barco.
O nosso roteiro pela América do Sul em 1990. O trechos entre Bauru e Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia, e entre Puno, Cusco e Arequipa, no Peru, foram de trem. Os outros trechos, de ônibus. Para retornar de Lima, avião para Iquitos e barco até Tabatinga, no Amazonas
Talvez por isso, ela nunca esteve no roteiro da Fiona ou dos 1000dias. Mas eu já estive lá uma outra vez, durante meu primeiro mochilão pelo continente, em Julho de 1990. Eu viajava com meu primo Haroldo e o amigo Marcelo e já relatei outras partes dessa mesma viagem aqui no site dos 1000dias, especialmente aqueles trechos interessantes do continente em que eu e a Ana não passamos dessa vez. Foi assim com a nossa passagem pelo Trem da Morte, quando subimos a montanha Chacaltaya, ao lado de La Paz, e quando percorremos a Trilha Inca, a caminho de Machu Picchu. Depois de conhecer as ruínas arqueológicas mais famosas do continente, nós fomos para Arequipa, no sul do Peru e, de lá, para a capital, Lima. Daí seguimos para Huaraz, na belíssima Cordillera Blanca, e Trujillo, no norte. Durante os 1000dias nós estivemos em todos esses lugares e por isso não relato aqui como foi a nossa experiência por eles naquele tempo. Faltava, então, retornar ao Brasil e foi então que passamos por Iquitos, numa travessia que incluiu aviões e barcos, não só para conhecer Iquitos, mas também as maiores cidades da região norte do nosso país.
Em 1990, nós voltamos do Peru para o Brasil de barco pelo rio Amazonas, saindo de Iquitos (onde só se chega voando ou navegando!) para Tabatinga, no Amazonas, fronteira com Leticia, na Colômbia
Já naquele tempo, a viagem a Machu Picchu era uma espécie de batismo de fogo para jovens estudantes brasileiros que pretendiam conhecer o mundo. O roteiro era quase sempre o mesmo, seguindo por terra (trem e ônibus) do Brasil ao Peru, através da Bolívia, e retornando pelo mesmo caminho. Alguns viajantes preferiam (se pudessem!) voar na volta, tanto de La Paz como de Lima, para aqueles poucos que esticavam a viagem até lá. Na época, nós quisemos fugir um pouco desse lugar-comum e inovar. Numa época sem internet, debruçados sobre mapas e guias, idealizamos uma volta alternativa, de barco, pela região amazônica. Bastaria chegar até Iquitos e, de lá, navegando pelo rio Amazonas, chegar até Manaus e Belém. Planos feitos, mãos a obra. Quando passamos por Lima, ainda antes de seguirmos para o norte do país, conseguimos comprar passagens aéreas para Iquitos. Nosso problema, além do dinheiro, era o tempo, pois tínhamos de retornar às aulas universitárias do início do 2º semestre. Uma corrida só! O bom de passagens aéreas, de trem ou de ônibus, é que podemos marcar datas e, quase sempre, confiar nelas. Estávamos para aprender que o mesmo não se pode dizer das viagens de barco, especialmente na região amazônica.
Chegando no aeroporto de Iquitos, no meio da amazônia peruana (foto de Julho de 1990)
Uma deliciosa casa de sucos e saladas de frutas em Iquitos, no Peru (foto de Julho de 1990)
Na data marcada, voamos para Iquitos. Aí conhecemos um outro Peru, completamente diferente daquele pelo qual vínhamos viajando nas últimas semanas. Somem os Andes, entra a floresta amazônica. Desaparece o frio, um calo úmido ocupa seu lugar. A típica fisionomia andina dos indígenas também é substituída pelos traços conhecidos dos índios amazônicos. O único elo é a língua espanhola. Aliás, que estranho que foi para nós, já no aeroporto, nos sentir na Amazônia, mas escutar todo mundo falar espanhol. O cérebro quase entra em parafuso. Iquitos, como eu já disse, é uma grande metrópole, cerca de 300 mil habitantes, e está completamente isolada das outras cidades do país e do planeta, pelo menos por vias terrestres.
O Haroldo observa o movimentado porto de Iquitos, na beira do rio Amazonas, no Peru (foto de Julho de 1990)
Barco lotado chega a Iquitos, na beira do rio Amazonas, no Peru (foto de Julho de 1990)
Naquela época, o turismo do ayahuasca (o famoso chá psicodélico amazônico), que atrai tanta gente a Iquitos nos dias de hoje, ainda não havia se desenvolvido e nosso principal objetivo na cidade era tomar o barco em direção ao Brasil. Mal encontramos uma pousada e corremos ao porto para tentar descobrir horários e comprar passagens. Foi quando descobrimos que, teoricamente, há barcos todo o tempo, mas que na prática, só saem quando estiverem cheios, de carga e de pessoas. Há vários barcos descendo o rio, mas o problema é acertar qual vai sair primeiro. Ficamos sempre com medo de nos comprometer com algum (pagar!) para depois descobrir que outros vão sair antes. Viagens marcadas para hoje podem muito bem esperar uma semana para zarpar. É o ritmo amazônico, mas nós não tínhamos tempo para nos adaptar a ele. O resultado é que íamos constantemente ao porto em busca de informações mais precisas e na torcida (e desespero!) para que zarpássemos o quanto antes. E entre uma visita e outra, fomos relaxando e curtindo o tempo naquela cidade tropical.
Embarcando no barco Iris, em Iquitos, no Peru, rumo a Tabatinga, no Brasil (foto de Julho de 1990)
Foram quase três dias de espera até que nosso barco, o Íris, zarpasse. Nesse tempo, nunca tomei tantos suco e comi salada de frutas na minha vida. Uma delícia! Saúde pura! A cidade e sua praça central, a sempre presente “Plaza de Armas”, parecem bastante o Brasil. Além da língua, claro, a diferença está na quantidade impressionante de moto-táxis nas ruas da cidade. Centenas, milhares! Na verdade, são triciclos, e acho que todo mundo se locomove dessa maneira por ali, inclusive nós. Deve ser mais barato levar esses veículos para lá, todos de barco, já que não há estradas. Sem contar o próprio combustível, já que são muito mais econômicos que carros. Por fim, o próprio calor amazônico, uma constante por ali. No triciclo, estamos sempre com um ar condicionado natural, o vento! Não só os veículos são abertos, mas os restaurantes, sempre com grandes terraços e sob a sombra de árvores. Até as igrejas, onde assistimos a um coral amazônico, são mais amplas, abertas e tropicais.
Navegando na parte peruana do rio Amazonas, de Iquitos, no Peru, a Tabatinga, no Brasil (foto de Julho de 1990)
Mas, por fim, partimos, com dois dias de atraso desde a primeira promessa do capitão. Para nós, acabou saindo mais barato investirmos em uma cabine do que comprar três redes para dormir em um dos dois decks do barco. Para os três, foi a primeira experiência no rio Amazonas, que tanto havia frequentado nossas aulas de geografia durante a adolescência. A emoção de estar lá, vendo-o com os próprios olhos, é até difícil de descrever. O rio é absolutamente enorme, mesmo estando a mais de 1.000 quilômetros da foz. Uma massa de água, imparável, rasgando a floresta ao meio. Uma hora depois de partirmos, a calma de navegar quase sozinhos no meio do rio e da floresta contrastava com o caos reinante no porto de Iquitos. Ali, um movimentado porto amazônico, barcos chegam e saem todo o tempo em docas improvisadas nas encostas do rio. Todo o tempo, centenas de pessoas entram e saem dos barcos, chegam e partem da cidade, rio acima ou rio abaixo. Um verdadeiro formigueiro humano que, depois de algumas visitas ao porto, passamos a compreender. Dentro do caos, uma certa ordem. Mas apenas aos olhos mais treinados.
Navegando por pequenos braços do rio Amazonas, na região de Iquitos, no Peru (foto de Julho de 1990)
Vitórias-régia em pequenos braços do rio Amazonas, na região de Iquitos, no Peru (foto de Julho de 1990)
Agora ali, no meio do rio, a calma é verdadeira. Sempre há botos cinza a nos guiar. O local mais gostoso do barco é o telhado, longe da confusão dos decks e da música alta. Por falar nisso, a cabine é terrivelmente barulhenta, quase em cima do motor. Abafada também, só ficamos ali de noite. A comida servida no barco não é das melhores, mas trouxemos bastante frutas da cidade. O banheiro é quase inusável e o melhor a fazer, se conseguirmos, é segurar. Os passageiros são quase todos peruanos e muitos deles nem sabem o que é ou onde é o Brasil, mesmo estando em um barco que vai descer o rio até a fronteira. “Brasil? Es uma ciudad?”.
Navegando por pequenos braços do rio Amazonas, na região de Iquitos, no Peru (foto de Julho de 1990)
Passageiros fazem força para tentar desatolar nosso barco do leito do rio Amazonas, na região de Iquitos, no Peru (foto de Julho de 1990)
Muitas vezes, o barco sai do curso principal do rio para entrar em algum afluente. Aí, em algum pequeno povoado ou fazenda, entram e saem pessoas, é descarregado ou carregado algo. É quando nos sentimos mais pertos da infinita floresta que nos rodeia. Pequenas canoas transitam para lá e para cá. Casas são flutuantes ou se sustentam sobre palafitas. São verdadeiramente os trechos mais interessantes da viagem, mas foi aí também que tudo mudou. O barco fez uma aproximação errada da orla do rio e simplesmente atolou. Pois é, atolados no rio mais caudaloso do mundo, parecia até piada. Piada também foi quando quase todos os passageiros desceram e tentaram empurrar o barco. Ele, obviamente, nem se mexeu. Para nós, ao menos, foi divertido, nadar no rio Amazonas que ali não tinha nem um metro de profundidade. A diversão acabou e o barco, muito carregado de combustível, continuava atolado. Chegou um rebocador para ajudar e nada. Chegou outro e nada. Estávamos completamente presos no meio do nada, centenas e centenas de quilômetros de florestas para todos os lados.
O sol nasce no rio Amazonas, durante nossa navegação entre Iquitos, no Peru, e Tabatinga, no Brasil (foto de Julho de 1990)
Foi quando um outro barco que seguia para a fronteira passou por ali. Com ajuda de barquinhos, todos os passageiros e suas bagagens foram transferidos. Só que agora, não tínhamos nem cabines e nem redes. A solução foi dormir no piso mesmo, embaixo das dezenas de redes penduradas no convés. Foram “apenas” mais 18 horas de viagem e não tinha outra solução. Melhor do que ficar ali, parados na floresta. Agora, mais do que nunca, com exceção de umas poucas horas de sono durante a noite, ficávamos no telhado do barco admirando a beleza grandiosa ao nosso redor. O nascer-do-sol sobre o rio Amazonas foi absolutamente espetacular e inesquecível, as água do rio pintadas de fogo pela luz da aurora. Que incrível!
O sol nasce no rio Amazonas, durante nossa navegação entre Iquitos, no Peru, e Tabatinga, no Brasil (foto de Julho de 1990)
Por fim, chegamos à Santa Rosa, uma pequena vila peruana construída sobre uma ilha do rio na chamada “fronteira tríplice”. Dou outro lado do rio, Colômbia e Brasil, Leticia e Tabatinga. Na pequena Santa Rosa, fizemos nossos papéis de saída e brincamos bastante com duas simpáticas e espertas meninas que haviam viajado conosco. Ficamos também impressionados com as cores de uma espécie de papagaio que vivia na casa do policial da fronteira. Verde, vermelho e amarelo! Uma ave tricolor ali na tríplice fronteira. Papéis prontos, atravessamos o rio de voadeira e voltamos, enfim, ao Brasil. Tabatinga não é a mais bela das cidades, muito pelo contrário. Mas era o primeiro pedacinho do Brasil em que pisávamos depois de 30 dias de andanças por Bolívia e Peru. Típica cidade de fronteira, uma tensão quase constante no ar. Tráfico de drogas e mercadorias são comuns por ali, mas para quem não está metido nisso, a preocupação maior é o forte calor. Estamos sempre procurando algum ventilador para nos aliviar um pouco.
Um papagaio todo colorido em Santa Rosa, fronteira entre Peru e Brasil, no rio Amazonas (foto de Julho de 1990)
Fazendo amizade com simpáticas crianças peruanas na fronteira entre Peru e Brasil, no rio Amazonas (foto de Julho de 1990)
Tabatinga está grudada em Leticia. Juntas, são quase 100 mil habitantes. Mas Leticia é infinitamente mais turísticas, uma das cidades mais procuradas na Colômbia por visitantes estrangeiros. Todos em busca de uma experiência na exótica Amazônia. Nós, depois de mais de dois dias navegando nas águas do maior rio do mundo e dos três dias esperando em Iquitos, já estávamos satisfeitos com a experiência. O que precisávamos mesmo era sair dali, pois o semestre letivo já começava a 4 mil quilômetros de distância, lá na UNICAMP, interior de São Paulo. Checando preços e alternativas, descobrimos que o barco e o avião custariam mais ou menos a mesma coisa até Manaus. Com a diferença de que uma viagem demoraria três dias e a outra, três horas. Com a pressa que estávamos, não foi difícil escolher. Voamos no dia seguinte, na extinta Varig. O mesmo raciocínio valeu para o trecho entre Manaus e Belém, alguns dias mais tarde. Só que dessa vez, voamos na extinta Vasp. As passagens podiam ser pagas em três vezes sem juros! Nos últimos 20 anos, nós nos esquecemos disso, mas a inflação daquela época era de 10% ao mês! Pagar em três vezes era um senhor desconto! Foi assim que voltamos à nossa Campinas, depois de um belo giro por Bolívia, Peru e Amazônia, um super primeiro mochilão que me fez pegar gosto pela coisa e que, para sempre, me serviria de referência nas muitas viagens que se seguiram nos anos e décadas seguintes. Como se diz por aí: “a primeira vez, a gente nunca esquece!”.
A fronteira tríplice entre Brasil (Tabatinga), Peru (Santa Rosa) e a famosa Leticia (Colômbia), na amazônia. Foi por aí que voltamos ao Brasil na viagem de 1990, vindos de barco de Iquitos, na amazônia peruana
P.S Para quem se interessar, os relatos dessa viagem de 1990 que estão no site dos 1000dias são:
1 - A viagem no Trem da Morte
2 - A subida do Chacaltaya, em La Paz
3 - A Trilha Inca até Machu Picchu
4 - Viajando pelo rio Amazonas do Peru ao Brasil (este post!)
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