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Karina (27/09)
Olá, também estou buscando o contato do barqueiro Tatu para uma viagem ...
ozcarfranco (30/08)
hola estimado, muy lindas fotos de sus recuerdos de viaje. yo como muchos...
Flávia (14/07)
Você conseguiu entrar na Guiana? Onde continua essa história?...
Martha Aulete (27/06)
Precisamos disso: belezas! Cultura genuína é de que se precisa. Não d...
Caio Monticelli (11/06)
Ótimo texto! Nos permite uma visão um pouco mais panorâmica a respeito...
Junto ao túmulo de Sir Ernest Shackleton no cemitério de Grytviken, na Geórgia do Sul
Quando uso a palavra “explorar” nesses meus textos de nossas viagens, tenho a consciência de está-la usando com uma certa “liberdade poética”. Verdadeiras explorações foram feitas por Leif Erikson, Marco Polo, Vasco da Gama, Colombo, Magalhães, Rhodes e outros gigantes da história. Eles sim viajavam para lugares ainda totalmente desconhecidos da civilização, de onde nada ou muito pouco se sabia, apenas lendas e mitos como fonte de informação. Essa é uma época de glórias passadas e todo o nosso planeta já foi visitado, fotografado, esquadrinhado e descrito por centenas de livros, guias e enciclopédias. O que sobrou para nós que tanto gostaríamos de ir aonde nenhum homem jamais esteve é o fundo do mar e o espaço sideral. Infelizmente, ambos completamente além das possibilidades de meros indivíduos.
Junto ao túmulo de Sir Ernest Shackleton no cemitério de Grytviken, na Geórgia do Sul
Sim, o que nós estamos fazendo talvez também seja inédito: viajar por todos os países do continente, suas ilhas e estados brasileiros. Sinceramente, não tenho notícia de ninguém que tenha feito isso antes. Mas isso não significa “explorar”. Talvez ninguém tenha feito tudo isso junto de uma só vez, mas todos esses lugares que vamos já foram sim visitados. Na verdade, muito mais do que isso. Foram visitados e descritos. Dez minutos na internet e sempre descubro milhões de informações sobre os lugares que estamos chegando durante essa viagem. Animais, plantas, montanhas, cidades, atrações, história, geografia, está tudo ali, muito bem explicadinho, seja para aprendermos, para seguir os passos ou para não repetir os mesmos erros. Enfim, sempre podemos ter uma boa ideia do que nos espera. Esse era o diferencial, ou mérito, desses grandes exploradores. Rumavam ao desconhecido, sem a ajuda da internet.
Rota do Endurance e sua tripulação e caminho de volta no barco a remo para a Geórgia do Sul
A última época romântica desses grandes exploradores se deu no início do séc. XX, há mais ou menos um século. Todas as regiões e continentes do mundo já eram conhecidos, os grandes rios e oceanos navegados, as maiores montanhas descritas e medidas (mas não escaladas!), com uma honrosa exceção: as regiões polares. O frio extremo era a última barreira a ser vencida, o polo sul e o polo norte o último graal dos exploradores de então. Ao contrário dos exploradores dos séculos anteriores, que buscavam civilizações perdidas ou territórios novos para suas nações, esta última geração de exploradores era inspirada simplesmente pelo desejo de ir aonde ninguém havia estado antes. Isso, e é claro, a glória pessoal e para sua nação de origem.
Sir Ernest Shackleton
Foi uma verdadeira corrida para ver quem chegaria primeiro aos pontos extremos do planeta. Uma corrida acompanhada avidamente por leitores de jornais em todo o mundo. Nomes como Scott, Amundsen e Shackleton, alguns dos maiores exploradores daquele tempo, eram tão ou mais populares que nomes de presidentes, reis e líderes nacionais. Foi uma corrida cercada de glórias e tragédias, onde a determinação, coragem e capacidade de organização desses aventureiros era levado ao seu limite, todos em busca da glória final, num roteiro de vida real dificilmente imaginado em obras de ficção. Esses grandes homens se conheciam, se frequentavam e se respeitavam, muitas vezes trabalhando juntos, outras vezes em competição direta, o que aumentava ainda mais a pressão sobre eles.
O Endurance preso no gelo da Antártida
Cães observam a desttruição do Endurance pelo gelo na Antártida
Assim foi na chamada “corrida final rumo ao polo sul”. A cada ano que passava, exploradores chegavam a latitudes maiores, mas foi no ano de 1911 que o ataque final ocorreu. De um lado, a equipe do norueguês Amundsen com a ajuda de cães rusky. Do outro, a equipe do inglês Scott com ajuda de pôneis. Depois de estabelecer vários depósitos ao longo da rota, o norueguês partiu no dia 20 de Outubro para vencer a imensidão branca e gelada do planalto antártico e chegar ao polo no dia 14 de Dezembro. Scott seguiu por outra rota, chegando ao polo sul 35 dias mais tarde, já em 1912. A decepção de lá encontrar a bandeira da Noruega só não foi maior que as agruras e dificuldades da volta, quando ele e seus companheiros acabaram morrendo de fome e frio a poucos quilômetros de um depósito de comida, já bem perto do litoral do continente. Essa história de sucesso e tragédia comoveu toda uma geração.
Shackleton e sua tripulação presos em Elephant Island
Saída para a longa viagem entre Elephant Island, na Antártida, para a Geórgia do Sul
O outro grande nome da exploração antártica, Ernest Shackleton, acompanhou toda essa história de longe. Tinha tido sua chance em anos anteriores e certamente tentaria de novo. Mas agora, com as glórias já nas mãos de Amundsen, ele se propôs um outro desafio: a primeira travessia transantártica. Entrar por um lado do continente e sair pelo lado oposto. Uma epopeia que faria os feitos de Amundsen e Scott parecer brincadeira de criança. Shackleton jamais conseguiria esse feito, mas ao tentá-lo, acabou por escrever uma das mais incríveis histórias da exploração humana.
Rota de Shackleton para cruzar da costa sul à costa norte da Geórgia (visão aberta)
Rota de Shackleton para cruzar da costa sul à costa norte da Geórgia (detalhe)
Recomendo a todos que leiam os livros que tratam dessa aventura, pois é nos detalhes que se percebe todo o mérito do poder de liderança de Shackleton. Resumidamente, o Endurance, o barco da expedição, deixou a Geórgia do Sul em dezembro de 1914 rumo à Antártida. Mas um verão excepcionalmente frio não só impediu o barco de chegar até o continente como o aprisionou no gelo no final de Janeiro de 1915. O Endurance e sua tripulação ficaram a deriva, presos no gelo que se movia lentamente para noroeste. Assim foi até Outubro deste ano, quando finalmente o casco começou a ceder e o barco teve de ser abandonado, sendo finalmente tragado pelo gelo no final de Novembro. A tripulação continuou a deriva no gelo até o início de Abril de 1916 quando tiveram de entrar nos dois pequenos barcos salva-vidas já que o gelo se desintegrava. Cinco dias de árdua navegação os levaram até a pequena e isolada Elephant Island, 1.300 km ao sul da Geórgia do Sul. Foi a primeira vez que pisaram em terra firme depois de 497 dias em alto mar.
mapa que mostra o caminho percorrido por Shackleton para chegar a Stromness. Nós fizemos o último trecho, a partir de Fortuna Bay. Exposto no museu de Grytviken, na Geórgia do Sul
Não havia nenhuma chance de resgate nesse lugar, completamente isolado de qualquer rota marítima. Shackleton resolveu partir para o tudo ou nada. Ele e cinco companheiros se lançaram ao mar no melhor dos barcos salva-vidas numa tentativa desesperada de chegar à Geórgia do Sul. Levando suprimentos apenas para 4 semanas, com velas rústicas e remos e com ajuda de correntes marítimas, conseguiram chegar à costa sul da ilha 15 dias depois, tendo enfrentado um furacão que chegou a afundar um cargueiro de 500 toneladas não muito longe dali. Na ilha, deixou dois companheiros mais debilitados junto ao barco e, junto com os outros dois restantes, tentou empreender a primeira travessia sul-norte da Geórgia do Sul, uma ilha com o interior extremamente montanhoso. Tinham uma corda de 12 metros e uma tábua de madeira para ajudar. Foram 36 horas de árdua caminhada para que chegassem a Stromness. Foram precisos outros 40 anos para que alguém conseguisse repetir essa mesma rota, tamanha a dificuldade do terreno.
Perambulando pelo cemitério de Grytviken, na Geórgia do Sul
Todos reunidos no cemitério de Grytviken para uma homenagem a Ernest Shackleton, na Geórgia do Sul
Ao chegar a Stromness, Shackleton imediatamente providenciou o resgate para seus companheiros no sul da ilha. Para resgatar os que ficaram em Elephant Island foi preciso mais tempo, mas por fim, no final de Agosto, dois barcos com Shackleton a bordo lá chegaram e resgataram a todos. Ninguém havia morrido. Uma verdadeira proeza até hoje admirada e respeitada principalmente por aqueles que conhecem os rigores da Antártida e as dificuldades de se comandar um grupo de pessoas em situações extremas e com tantas adversidades. Shackleton virou um herói e cavaleiro do Império Britânico, Sir Ernest Shackleton. Mas não se aquietou. Os genes da aventura e exploração falavam mais alto. Tanto para ele como para Amundsen.
Todos ganham um pouco de uísque para um brinde a Ernest Shackleton no cemitério de Grytviken, na Geórgia do Sul
Visita ao cemitério de Grytviken, na Geórgia do Sul, onde está enterrado "The Boss", Sir Ernest Shackleton
O britânico estava no comando de outra expedição à Antártida em 1922. Chegou a parar no Rio de Janeiro, onde sentiu-se mal. Insistiu em continuar e, poucos dias mais tarde, já em alto-mar, morreu de ataque do coração. Antes que seu corpo seguisse de volta para a Inglaterra, chegou o telegrama de sua esposa: “Enterrem-no na Geórgia do Sul. Seu corpo e espírito pertencem a este lugar”. E assim foi. Carinhosa e respeitosamente chamado de “boss” (chefe) por todos, amante inveterado de um bom uísque, é a estrela máxima do pequeno cemitério de Grytviken, onde hoje estivemos prestando nossas justas homenagens.
O nosso guia de história, Damien, faz um brinde a Ernest Shackleton no cemitério onde ele está enterrado, em Grytviken, na Geórgia do Sul (foto de Susan Pairaudeau)
A Cheli também presta suas homenagens a Shackleton no cemitério de Grytviken, na Geórgia do Sul
Todos os passageiros do Sea Spirit se alinharam no cemitério. Foi servido um pouco de uísque para todos nós. O Jim, nosso guia historiador fez um discurso emocionado e emocionante. Ao final, todos brindamos e deixamos um gole para o Boss. Ao final, até nossa líder da expedição, sempre tão eficiente e chefona, ficou ali, ao lado do túmulo, prestando sua homenagem particular.
Um brinde a Ernest Shackleton no cemitério de Grytviken, na Geórgia do Sul
Para mim, que já sabia da história dele há uns bons anos, foi mesmo emocionante ter estado por lá. Gloriosos tempos de exploração verdadeira. Por falar nisso, também Amundsen não soube se aquietar. Continuou explorando o polo norte, primeiro de barco e depois de dirigível. Foi o primeiro a sobrevoar o polo norte e o primeiro homem a ter estado nos dois polos. O primeiro norueguês a pilotar um avião. Não queria parar. Até que, em 1928, com apenas 56 anos, ao pilotar um hidroavião em busca de um amigo e aventureiro perdido nos mares do norte, sumiu ele também para nunca mais ser encontrado. Sangue de aventureiro não se aquieta nunca. Nem de viajante...
Todos reunidos no cemitério de Grytviken para uma homenagem a Ernest Shackleton, na Geórgia do Sul
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